São Paulo, sábado, 04 de janeiro de 2003

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MOTOR

Schumacher da Silva

JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE

A ciência ou uma pseudo-ciência mostrou nestes últimos dias a solução final para a F-1: a clonagem. Laboratório das pistas, vanguarda da tecnologia, a maior categoria do automobilismo só tem uma saída: produzir bons pilotos em série, uma família só de Schumachers e entupir o grid com duas dezenas de alemães excepcionais e queixudos.
Claro, poderiam ser duas dezenas de Clarks ou Sennas, como preferirem. Mas como o parâmetro atual é o pentacampeão, e ele já tem mesmo cara de piloto de laboratório, vai assim mesmo.
Duas dezenas talvez não sejam suficientes, a vida é cheia de percalços. Alguns não devem vingar, outros vão se interessar por música, outros vão se apaixonar e alguns outros simplesmente vão considerar essa história de carro muito chata. Estimo, por estatística, que, em um universo de 50 Schumachers, pelo menos 20 se interessem seriamente pela coisa.
Bem, seria necessário esperar uns 20 anos para todos crescerem fortes e saudáveis. Para amenizar a espera pelo maior Mundial de todos os tempos, talvez fosse o caso de as emissoras de TV acompanharem a trajetória de cada um, das fraldas às pistas, um reality show planetário. A cada 15 dias, que tal nas manhãs de domingo, acompanharíamos os pequenos Michaels e suas pequenas travessuras, as primeiras voltas de velocípede, os xixis na cama, as notas no colégio, os primeiros beijos, os torneios de kart, as primeiras vitórias, as primeiras derrotas.
Alguém provavelmente teria a genial idéia de colocar cada um deles em países diferentes, com pais diferentes e educações diferentes. E com um forte argumento: garantido geneticamente o talento, descobriríamos finalmente se é a água do Brasil que forma bons pilotos. Ou se é o cheiro de gasolina das oficinas inglesas. Ou se é a paixão italiana, a tradição francesa, a Mercedes-Benz, Indianápolis ou a simples alegria australiana de assistir corridas.
Sensacional, não? Não haveria desculpa, passaríamos duas décadas engordando nosso pequeno Michael, que chamaríamos de Zé, João, Silva, sei lá, apenas para imprimir uma tonalidade local. Infância em Santa Catarina, para que ele não perder o sotaque alemão e o gosto pela cerveja, estudos em São Paulo e férias no Nordeste, nadando no mar e brincando de capoeira, uma genuína preparação física do bananal -e para mesclar, um judô em São Caetano e pode ser útil em momentos difíceis um jiu-jitsu no Rio.
Alguém me lembra também que seria fundamental trancá-lo por alguns meses, talvez um ano, com Piquet em determinado ponto inóspito do Mediterrâneo. E, finalmente, correr, correr muito, de Guaporé a Tarumã, de Curitiba a São Paulo, de Goiânia à Brasília, de Jacarepaguá à qualquer avenida que tenha racha.
Óbvio, vai faltar dinheiro para a formação, mas isso faz parte do automobilismo nacional. E, afinal, não era o Schumacher genuíno que escolhia pneus usados dos garotos ricos para correr de kart?
Se vai dar certo? Claro que vai, é batata. Vai dar tão certo que vamos esquecer que ele é um Schumacher. Ele será apenas mais um Silva, terá a pele encardida pelo sol, falará palavrão, será um honesto quarto-zagueiro e vai dizer, quando ganhar de seus irmãos de laboratório, beijando uma camisa da seleção e com uma lata de cerveja quente na mão, que essa história de genética é cascata.

Mais mudança
A "Autosport" publicou que a FIA e os times decidem no dia 15, em Heathrow, o banimento do controle de tração e da telemetria bidirecional -a que permite aos técnicos nos boxes regularem o carro na pista. A alegação é diminuir custos. E a despeito da aprovação ou não, a entidade adianta que vai aumentar o rigor nas inspeções técnicas durante os GPs, principalmente em áreas ainda nebulosas para os fiscais, como sistemas de freio, suspensão e diferencial.

Vôo solo
A Williams confirmou nesta semana que contou apenas com suas forças na construção do estreante FW25. Há alguns meses, após fazer críticas educadas mas duras ao modelo anterior, a BMW ofereceu engenheiros e tecnologia de chassi que desenvolve por conta própria desde sua primeira participação na F-1, nos anos 80. Patrick Head declinou. Se o carro não render o esperado, os parceiros mais afinados da F-1 no momento viverão sua primeira crise.


E-mail - mariante@uol.com.br


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