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Por esporte, mulheres enfrentam homens
Competidoras de elite sofrem para achar oponentes à altura no Brasil
"Lutar com meninos é uma forma de me motivar. Eu me desenvolvo mais", afirma Natália Falavigna, campeã mundial de taekwondo
MARIANA LAJOLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Natália Falavigna já viu a cena se repetir várias vezes. Chega às competições e nem sequer
precisa entrar no tatame para
ganhar a medalha de ouro. Adversárias não aparecem ou não
querem lutar com ela.
O Brasil não tem hoje atletas
de seu nível. Campeã brasileira
e mundial de taekwondo, a atleta precisa viajar ao exterior para enfrentar rivais à altura.
"É um pouco frustrante ganhar sem lutar. Gosto de treinar, mas tenho que sentir a sensação da luta", diz Natália, 22.
Espalhadas pelo país, atletas
de diversas modalidades sofrem com a falta de rivais fortes
e até de companheiras que
acompanhem seus treinos.
Para manter o nível, têm de
trabalhar com homens. E, em
muitos casos, é contra eles que
saem em busca de seus troféus.
Karen Jones, 22, conhece como poucas essa realidade.
Campeã mundial de skate vertical (disputado em pista em
"u"), a brasileira é cultuada fora
do país. Em sua terra natal, porém, é sempre o "corpo estranho" nos torneios masculinos.
"Só enfrento meninas lá fora.
Contra elas, tenho a responsabilidade de ganhar e ganhar
bem. Contra os caras, não tenho tanto compromisso. Se não
ficar em último, ótimo", brinca.
Karen sofre com o mesmo
problema de atletas que praticam lutas. Ainda existe o preconceito de que certas modalidades não são para mulheres.
Liliane Oliveira tem 18 anos e
treina boxe há seis. Com 1,49 m,
pés 33 e sorriso maroto, aparenta fragilidade. Mas dificilmente encontra rivais que
queiram encará-la no ringue.
"Temos de pegar meninas de
duas ou três categorias acima",
diz o técnico Marcos Macedo.
"Ainda há preconceito. Várias mulheres buscam boxe para malhar o corpo, mas são poucas as que aceitam se aventurar
a subir no ringue e competir."
Encontrar garotos para treinar com Liliane também é
complicado, e a procura demanda muita sensibilidade.
Raramente o cenário é diferente: ou o atleta bate forte para a garota perceber que ali não
é seu lugar ou não solta os golpes com medo de machucá-la.
Pedro Jorge Maprelian é exceção. Forte, orelhas marcadas
pela disputa de outros tipos de
lutas, tatuagens pelo corpo, é
sparring perfeito para Liliane,
bronze no pan-americano.
"Preconceito é bobagem.
Gosto de treinar com ela porque aprendo com sua velocidade, sua técnica. Tento exigir dela na medida certa", afirma.
Mas nem todos pensam da
mesma forma. E os dentes de
Liliane são testemunhas disso.
Certa vez começou a treinar
com um atleta da seleção. Estava bem, fazia pontos e arrancava elogios da platéia. O sparring
não agüentou as gozações.
"Ele deu duas cabeçadas que
amoleceram meus dentes", diz.
Fernanda Oliveira, 26, bronze sul-americano da classe 470
da vela em cima de duplas masculinas, também já foi hostilizada. Entre mulheres, não vê
ameaçada sua soberania -acumula dez títulos brasileiros.
"A gente brinca que vai comprar saia para eles. A maioria leva numa boa. Mas já teve quem
não gostou e jogou o barco em
cima da gente. Passou por cima
da amizade porque não queria
perder para garotas", afirma.
Apesar dos percalços, o intercâmbio é visto com bons olhos.
É unanimidade: os treinos com
homens são mais exigentes.
Técnicos de esportes coletivos também usam a estratégia,
como em jogos-treino do vôlei
e do pólo aquático, para testar o
nível das competidoras.
Nos EUA, porém, a prática
gerou polêmica. A NCAA, entidade que controla as ligas universitárias, evoca a constituição para impedir que mulheres
e homens treinem juntos.
"Não ligo de não ter rival [no
Brasil], desde que possa manter
meu nível. Lutar com meninos
é uma forma de me motivar e
achar parâmetros de comparação para meu rendimento. São
mais fortes, mais ágeis, eu me
desenvolvo mais", diz Natália.
Seu treinador, Fernando Madureira, toma cuidados. As lutas são com garotos de categorias mais leves. E o treino sempre pára quando há sinais de irritação no semblante da atleta.
"Presto atenção no lado psicológico. A disputa é dura, se
ela começa a apanhar, pode
perder o foco", diz ele. "Depois,
quando vai lutar contra uma
menina, parece que nem sente
mais os golpes", completa.
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