São Paulo, quarta-feira, 04 de julho de 2001

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FUTEBOL

Velhos problemas

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

Se o Brasil tivesse uma equipe maravilhosa, correria grandes riscos de perder para o Uruguai em Montevidéu. É um fato. Outro, é que foram repetiram os crônicos problemas individuais e táticos.
Sempre que a seleção perdia e ou jogava mal, diziam que faltava garra e amor à camisa. Com Felipão, seria diferente. O novo técnico falou em falta de malandragem e de picardia. Ricardo Teixeira completou: "Faltava o futebol bandido".
O péssimo calendário brasileiro é um dos motivos do mau futebol da seleção, mas estão lhe dando exagerada importância. A deficiência é principalmente técnica, tática e de confiança.
Os jogadores perderam a ousadia e a alegria de brincar com responsabilidade. O time está muito triste e burocrático.
Ao assumir o comando, Felipão disse que a equipe sairia da mesmice, que jogaria com uma linha de três zagueiros e dois alas e que os "estrangeiros" atuariam como em seus clubes. Nada disso aconteceu. Quem sabe no próximo jogo?
O Brasil atuou em seu tradicional e ultrapassado esquema tático. Pior, improvisou um zagueiro na função de volante. Na verdade, Roque Júnior fez o que fazem quase ou todos os volantes: desarmam, tocam a bola para o lado e se atrapalham quando tentam um passe mais longo ou avançam.
Os volantes brasileiros, não somente o Roque Júnior, não são armadores nem zagueiros. Não participam do ataque e estão sempre atrasados na cobertura dos zagueiros e laterais. Os técnicos insistem em dizer que eles funcionam defensivamente como um terceiro zagueiro.
Em quase todas as seleções do mundo, jogadores de meio-campo são armadores. Atacam e defendem. Para não enfraquecer o sistema defensivo, os treinadores escalam três verdadeiros zagueiros ou põem os laterais na função de marcadores, ao lado dos dois zagueiros, formando uma linha de quatro defensores. Seleção nenhuma do mundo, com exceção da brasileira, joga com dois zagueiros e dois laterais apoiando.
Todos os técnicos sabem que os zagueiros brasileiros vão tocar a bola para os volantes, que vão demorar 500 anos para girar o corpo e tocar para o lateral. Bem marcados, os laterais voltam a bola para os volantes, que, livres, começam tudo de novo. Quando avançam, passam errado, já que não têm habilidade. No contra-ataque, os dois zagueiros ficam sem cobertura contra dois atacantes.
Assim aconteceu o gol do Uruguai. Querem colocar a culpa no Antônio Carlos, que não fez a falta. Estão até dizendo que faltou o Galeano para derrubar o Recoba. Aí é demais. Esquecem que o Riquelme deu um show de bola no Galeano.
Antônio Carlos não fez a falta porque ele e o Cris, sem cobertura contra dois atacantes, ficaram preocupados com o Dario Silva. Nessa indecisão, o habilidoso Recoba foi driblando até sofrer o pênalti. Se houvesse um terceiro zagueiro ou se o Cafu estivesse na lateral -e não na frente-, seria diferente.
Para atuar no ataque com os dois laterais apoiando, como faz o Brasil, é essencial usar três zagueiros. Para jogar na defesa, recuar a marcação e priorizar o contra-ataque, o melhor esquema é a linha com quatro defensores, como fez o Uruguai. Os técnicos brasileiros e europeus geralmente fazem o contrário.
Para ultrapassar um forte esquema defensivo como o do Uruguai, é necessário driblar e cavar faltas próximo à área (Juninho só driblou na lateral), ter bons cabeceadores e cruzadores da linha de fundo e marcar a saída de bola. Quando se recupera a bola no campo rival, os armadores e os atacantes estão próximos do gol e os zagueiros, desprotegidos. O Brasil não marcou por pressão, não recuou nem usou o contra-ataque. Ficou cercando, fazendo sombra.
Rivaldo e Romário foram os piores dos piores.
O jogador do Barcelona perdeu sua confiança, e a torcida, a paciência.
Há muito tempo Romário é problema e solução. Tem momentos geniais -foi o maior centroavante do mundo de todos os tempos- e outros totalmente apagados. É, hoje, um grande risco. Felipão terá de resolver essa questão. Não pode ser refém do Romário. Ele somente deveria jogar em boas condições físicas e técnicas.
Falta à seleção brasileira um grande jogador de meio-campo.
Rivaldo, Juninho, Alex e outros atuam da intermediária para o gol. Os volantes jogam no campo do Brasil. Ninguém pensa nem organiza o jogo no meio-campo.
Felipão convocou seis atacantes, dois meias-atacantes e três volantes. Nenhum típico armador. Ainda deixou os três atacantes velocistas na reserva e escalou Élber e Romário juntos. Um marcando o outro.
O leitor Carlos Alberto envia-me um e-mail dizendo que "falar é fácil". É verdade!
Os técnicos reclamam a mesma coisa dos comentaristas. Não tenho a pretensão de achar que minhas opiniões darão certo na prática. Há dezenas de fatores envolvidos no resultado de uma partida.
Uma teoria é boa até ser desmentida na prática.
Aí cria-se uma nova. Sem uma boa teoria, porém, não se faz nada bem-feito.

E-mail
tostao.folha@uol.com.br



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