São Paulo, sábado, 05 de junho de 2004

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Cuba joga pela pátria e por US$ 10

Funcionários do governo de Fidel Castro, jogadores da seleção cubana treinam no Brasil para tentar pela primeira vez na história da ilha a classificação para uma Copa do Mundo

Felipe Varanda/Folha Imagem
O atacante Disney controla bola durante treino da seleção cubana para as eliminatórias, no Rio


SÉRGIO RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO

Eles dizem que jogam futebol por amor à bola e à pátria, são contra a comercialização do esporte e se recusam a largar os estudos para entrar num campo.
Na contramão do pensamento da maioria dos craques do futebol mundial, esse é o discurso dos jogadores da seleção cubana. A equipe se prepara há dez dias no Rio para jogar a segunda fase das eliminatórias da Concacaf (América do Norte, Central e Caribe).
O time enfrenta a Costa Rica, no dia 12, em Havana. No dia 16, pega os costarriquenhos fora de casa. A competição classificará três países da região ao Mundial de 2006.
"Jogamos pelo nosso coração e pela camisa do nosso país. Não vejo outro motivo. Quero apenas me divertir e levar o nome de Cuba o mais longe possível", disse o lateral-esquerdo Livan Pérez, 27, um dos destaques da equipe nos amistosos realizados na cidade.
Pérez e seus colegas vivem uma realidade completamente diferente da dos jogadores da seleção brasileira. Enquanto a maioria do time de Parreira joga no exterior e fatura alto com publicidade, todos os cubanos são funcionários do governo e recebem, em média, US$ 10 por mês -cerca de R$ 31.
"Não preciso de tanto dinheiro assim. Minha família tem educação, médicos e diversão em Cuba. Não consigo entender o motivo de uma pessoa ganhar milhões de dólares enquanto várias outras passam fome ao seu lado", afirmou o atacante Disney Aquino, 27, batizado com o nome do criador de um dos maiores impérios do entretenimento americano.
Na ilha, eles são considerados amadores e não vivem do futebol durante todo o ano -o esporte não é popular no país e nunca conseguiu se classificar para disputar uma Copa do Mundo.
"O Campeonato Cubano é curto, dura apenas seis meses. Depois disso, a seleção é formada. No período em que não há futebol, quem fica fora do time nacional se dedica mais aos estudos", declarou Pérez, que atualmente está cursando o terceiro ano da faculdade de educação física.
Na delegação que está se preparando no Brasil, o time é formado basicamente por professores, estudantes e engenheiros.
Apesar de encantados com a habilidade do futebol nacional, os jogadores e os integrantes da comissão técnica não escondem o desconforto com a mercantilização do esporte no Brasil.
"Não posso entender o motivo de você beber uma cerveja e achar que vai jogar futebol melhor", disse o fisioterapeuta Manuel Tabio, 51, referindo-se ao anúncio da AmBev estrelado pelo atacante Ronaldo, do Real Madrid.
"Fiquei sabendo de muitas histórias de bons jogadores brasileiros que ficaram pobres depois de abandonarem os campos. Por isso, acho que estamos num caminho melhor. Depois que a minha carreira terminar, sei que tenho uma profissão pela frente. O meu sonho não é ficar milionário", declarou Pérez, que está disputando, pela primeira vez, as eliminatórias para uma Copa.
"Quando parar de jogar, quero ser treinador. Ensinar futebol para crianças será a grande realização da minha vida", completou.


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