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MOTOR
O troco
JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE
Confesso que me diverti por
instantes no último domingo. Acreditei também por instantes que Schumacher tentou fabricar um "dead heat" sobre os famosos tijolinhos de Indianápolis.
O alemão pode ser um sujeito tacanho, mas é esportivamente sofisticado. Acreditei e ainda acredito que Barrichello não entendeu a brincadeira, pois não enfiou o pé no freio como o companheiro, gesto naturalmente difícil
para quem vem em segundo.
Não deu certo, apesar dos sete
centímetros ou 11 milésimos. Não
daria certo mesmo se Schumacher cruzasse à frente. A Ferrari
pode tudo nesta temporada, mas
parece um pouco demais buscar
os limites da cronometragem eletrônica em plena bandeirada. É
achincalhar a concorrência.
A marca vai entrar para a história como a chegada mais apertada. Gethin e Peterson, em 1971, fizeram 0s01, não havia o terceiro
dígito, a cronometragem já era
muito precisa, mas manual.
Porém, como escreveu Tostão
há alguns dias, a mensagem analógica, subjetiva, é muito mais rica que a digital, com palavras (ou
números, adapto). Gethin e Peterson aceleravam. Schumacher e
Barrichello tiravam o pé, trocavam gentilezas, brincavam como
fazem dois atacantes com a bola,
à beira do gol, após superarem até
o goleiro. A diferença é cabal.
Após esse curto raciocínio, desacreditei minha pequena euforia.
Não me lembrei da Áustria, antes
de marmelada, uma grande bobagem. Não me lembrei da temporada regiamente calculada por Ross Braw, compassada por bananas. Não seria necessário.
Vi Schumacher e Barrichello se
abraçarem antes de subir na balança, o alemão falando ao ouvido do brasileiro no único momento que teriam a sós antes das entrevistas. E antevi o óbvio, que, no
dia seguinte, o mundo inteiro ia
descer a lenha na Ferrari e em
seus dois pilotos, pouco importando quem decidiu o quê ou se ninguém decidiu nada e o resultado aconteceu por absoluto acaso.
Jean Todt, nesta semana, após
nova enxurrada de críticas, exigiu respeito ao trabalho de excelência feito pela Ferrari nos últimos anos. Fosse para ser contundente, poderia dizer com propriedade que a marca italiana torra
milhões em seu projeto enquanto
os adversários cortam os orçamentos -por isso o campeonato
desandou no segundo semestre.
Mas seria em vão. O time italiano não está sendo julgado pela
sua superioridade, mas pelo que
faz com ela. Na verdade, está
abastecendo detratores, que, repentinos arautos do espírito esportivo, pregam até intervenções
na categoria, o que varreria para
debaixo do tapete a incompetência que campeia na F-1 atual.
(E a gritaria aumenta cada vez
mais, basta ver a capa da última
"Autosport", com Ecclestone prometendo revisão completa do regulamento e Tony George dando
a bandeirada para as duas Ferraris sob a inscrição "nova farsa".)
Maranello e especialmente
Schumacher estão seduzidos por
um dos mais brilhantes projetos
da história da categoria. Sentem
que estão no controle das ações
-e, no final das contas, estão.
Têm tudo para continuar assim
até o final de 2004, a concorrência
não tem lastro técnico ou humano. Mas resta um adversário, o
pior deles, a queda dos índices de
audiência, leitura digital feita
analógica pelos adversários.
Por muito menos, várias "eras"
na F-1 acabaram.
Só falta o metanol
As soluções de Ecclestone para a F-1 são simplistas: fornecedor
único de pneus, banimento da ajuda eletrônica, redução do
"downforce" e revisão no método de classificação. Não seria mais
fácil ele comprar a Ferrari e demitir o alemão?
Flagrante
No meio do GP dos EUA, um repórter europeu entrou em uma das
cantinas de Indianápolis. Os funcionários do restaurante, vazio,
assistiam a uma corrida pela TV. Uma corrida da Nascar.
Mico
Miami, que pode assistir ao título antecipado de Cristiano da Matta, receberá uma equipe de filmagem da National Geographic.
Não, não estarão documentando uma atividade humana em vias
de extinção. O tema é o comportamento do corpo a mais de 200
km/h. Nascar e IRL também serão visitadas. Vai ao ar em 2003.
E-mail mariante@uol.com.br
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