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Complexo de vira-latas
TOSTÃO
Colunista da Folha
Após o apito do juiz na final
da partida entre Palmeiras e
Manchester, os telespectadores
brasileiros ficaram perplexos
diante da pouca alegria dos ingleses, próxima da indiferença.
Parecia que tinham ganho um
torneio de pelada.
Esse comportamento é natural
de um povo frio, austero e de primeiro mundo ou consequência da
pouca importância que deram ao
título não oficial, disputado num
único jogo?
Provavelmente as duas razões.
Não estou preocupado com o
comportamento dos ingleses e sim
com a excessiva importância que
o Brasil dá ao futebol.
O povo brasileiro vibra, chora,
xinga e fica alucinado com seu time. A televisão ufana-se e dá ao
espetáculo e à equipe brasileira
um valor acima de qualquer expectativa. Quanto mais badalar,
maior é o faturamento.
O Brasil não precisa ser frio e indiferente como os ingleses, nem
fazer de uma decisão o acontecimento maior de sua vida.
O país ficou mais desumano e os
torcedores projetam toda sua
frustração e falta de oportunidade
no esporte.
Eles deveriam transferir um
pouco de sua emoção e vibração
para a cobrança dos problemas
urgentes do país.
Em outras épocas, além da vitória, havia um prazer, um sentimento de vingança e uma vontade de jogar a bola entre as pernas
dos europeus.
Era uma maneira de dizer: "Vocês são mais ricos e desenvolvidos,
mas no futebol somos melhores".
Os times brasileiros que vão disputar o título em Tóquio passam
seis meses preocupados com a
partida.
A ansiedade, expectativa e importância exagerada ao jogo minam progressivamente a tranqüilidade que é necessária para essa
partida.
Os jogadores se sentem como
soldados que vão para a guerra,
intranqüilos, próximos da glória e
do fracasso.
O medo de perder e de ter uma
nova desilusão destrói a confiança. Os brasileiros são derrotados
antes dos jogos, por causa de suas
inferioridades psíquicas.
É a volta do "complexo de vira-latas" (Nelson Rodrigues).
Será que saberemos hoje quem
serão os finalistas do Campeonato
Brasileiro?
O Vitória, que joga em casa e
tem ótimos armadores e atacantes, vai pressionar e ter grandes
chances de fazer gols.
Do outro lado, o Atlético-MG,
que vem de quatro vitórias consecutivas no Mineirão e tem novo
técnico, faz hoje seu grande teste.
O time, que tem um rápido e habilidoso contra-ataque (se Marques jogar), pode aproveitar a fragilidade da defesa adversária.
Não sei quem fará mais falta ao
Galo: sua apaixonada torcida ou
a provável ausência do Marques.
A vantagem do Corinthians pode ser boa ou ruim.
Ela pode gerar uma confiança
exagerada, uma falta de desejo de
procurar o gol e perturbar ou incentivar o São Paulo.
As reações humanas são analisadas posteriormente, mas não
são previstas.
O São Paulo tem que rezar para
que seus zagueiros não cometam
tantos erros.
O problema não é somente de
posicionamento, mas principalmente de qualidade.
O time terá os reforços ofensivos
do Ânderson e do Vágner pelo lado direito, e defensivo, com a ausência do Nem na zaga.
Se eu fosse apostar na loteria e
somente pudesse marcar um resultado, votaria num empate nos
dois jogos.
Teria um terço de chance de
acertar. É mais ou menos a mesma possibilidade de o Dida defender um outro pênalti.
Do meu escritório, em minha
casa, aprecio a chuva, as flores e os
animais.
Estou descobrindo coisas importantes. Uma delas é o desabrochar
das hortênsias, formando um
conjunto harmonioso: umas de
cores brancas, outras roxas e as
azuis. Belo e simples.
Outra descoberta é a do pica-pau de cabeça vermelha, com seu
enorme bico, que conhecia somente dos desenhos animados e
revistas em quadrinhos.
Outro dia vi um beija-flor parado no ar, como o Dadá Maravilha
e o helicóptero. Começo a aprender a ver e sentir, sem entender.
No filme "Zorba, O Grego", Zorba, homem simples, inculto, mas
sábio e pleno de vida, pergunta ao
seu patrão, homem reflexivo, contido e culto, que não parava de ler:
"O que os seu livros falam da vida
após a morte?".
O homem sério responde: ""Os livros não sabem a resposta". Zorba, decepcionado, retruca: ""Então
seus livros não sabem de nada".
Sempre fui uma pessoa urbana
querendo compreender o sentido
da vida, os mistérios, os conflitos e
a ambivalência da alma humana.
Pra quê?
Não sei o que mais gostava ao
ver a Ana Moser jogar: sua alma
guerreira, suas cortadas magistrais ou a bela expressão austera,
concentrada, determinada e enigmática. Ana não foi uma estrela
passageira do vôlei.
Seu brilho será eterno.
A Folha perdeu Juca Kfouri, referência do bom e independente
jornalismo esportivo, e ganhou a
Soninha, que tem opinião sensata, inteligente e profunda.
Tostão escreve aos domingos e às quartas-feiras
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