São Paulo, quinta-feira, 06 de junho de 2002

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SONINHA

Para poder comemorar sem raiva e sem xingar


Se os zagueiros não saírem jogando, quais são as alternativas? Será que a idéia é só o chutão para a frente?


Durante o jogo Uruguai x Dinamarca, meu marido foi à padaria e ouviu um berreiro medonho no prédio vizinho. Pensou: ""Ou é briga de família, ou foi gol". Viu um pano azul na janela e correu para bar da esquina, a tempo de ver a reprise do gol de empate da celeste.
Nossas comemorações são assim, não muito diferentes dos protestos: gritos, palavrões e gestos obscenos são comuns quando a bola balança a rede adversária.
Nossa paixão pelo futebol se traduz em raiva explosiva, contra ou a favor.
As comemorações da torcida coreana são diferentes. São de alegria pura, sem sobrancelhas cerradas e punhos fechados. Como é bom ficar feliz, simplesmente!
Só experimentamos sensação semelhante quando nosso time marca o quinto ou sexto gol do jogo, em uma vitória tranquila. E olhe lá.
Eu também torci pela Coréia, sem qualquer sinal de piedade (às vezes tenho, o que não é nada esportivo: ""coitados, queriam tanto, podiam marcar um golzinho pelo menos"").
Adorei o jogo deles, com velocidade, bom posicionamento e qualidade no passe. Eles erravam mais quando brincavam com habilidade no meio-de-campo, tentando toques de calcanhar e dribles arriscados, mas tinham mesmo de tentar. É bom sinal. Esse time vai dar um trabalhão para Portugal, que foi um desastre na estréia. Eu, hein, Pauleta? Como a Coréia não tem tradição no futebol, duvido que as análises sobre sua seleção sejam controversas como as nossas. A polêmica faz parte de uma cultura mais ""rodada". As opiniões sobre Denílson, Rivaldo e Juninho, por exemplo, variam entre ""foi o melhor" e ""não acrescentou quase nada". Mas as conclusões mais estranhas são mesmo de Luiz Felipe.
Ele não quer que os zagueiros saiam jogando (como boa parte da torcida sobressaltada), mas foi dele a idéia de aproveitar Edmilson e Roque Júnior como volantes alternativos. Não é à toa que os jogadores da defesa ainda não sabem bem a função de cada um...
O próximo problema é o seguinte: se os zagueiros não saírem, quais são as alternativas? A distância entre a defesa e o ataque é enorme. Será que a idéia é só o chutão para a frente? Nunca pensei em dizer isso, mas eu queria mais um volante (e menos um zagueiro, claro). Ainda espero gostar mais do Brasil do que gostei da Coréia, e comemorar um gol nosso sem xingar.

soninha.folha@uol.com.br



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