São Paulo, sábado, 6 de junho de 1998

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JANIO DE FREITAS

As inseguranças selecionadas

Se houve o murro, cá entre nós, foi bem aplicado. Esse Leonardo não é só agressor contumaz, é agressor covarde.
E, comparada com a agressão estúpida que Leonardo cometeu em campo na Copa de 94, do possível murro de Edmundo nem ao menos direi que aconteceu em hora imprópria.
Mesmo porque, ouso dizer, para um bom soco, como o sempre merecido por um agressor covarde, todas as horas são próprias.
Ainda por outro motivo o murro ou, vá lá, o entrevero não veio em hora imprópria.
Nas condições em que, obviamente, está a delegação, todas as horas se tornaram propícias para incidentes, queixas ásperas e exaltações várias.
Não é preciso estar almoçando com os jogadores para saber que a insegurança é a sensação dominante entre eles.
A simples proximidade de qualquer competição é inquietante.
Para dar uma idéia dos efeitos dessa situação, os batimentos cardíacos de um piloto de Fórmula 1, nos momentos que antecedem a largada, elevam-se aos níveis constatados nos astronautas já instalados para o lançamento.
Condição talvez mais assemelhada à dos times que vão disputar a Copa, a simples chegada dos pilotos na área do circuito, nos dias que precedem o início dos treinos para a corrida, já os tira do ritmo cardíaco habitual.
Essas e outras pesquisas, feitas na Fórmula 1 por iniciativa do tricampeão Jack Stewart, quando ainda piloto, deveriam ocorrer em todos os esportes e nas situações neles vividas.
O caso atual da seleção brasileira vai além dos efeitos previsíveis com a simples proximidade dos jogos.
A dose adicional vem da insegurança provocada por Zagallo.
E pela qual não só os jogadores são alcançados, mas, em outra proporção, também cada um dos que há tempos notam um Zagallo sempre tergiversante na escolha de jogadores, incapaz de montar um programa consistente de preparação, ainda agora perplexo na tarefa de definir um time e o respectivo esquema de jogo.
Todo jogador, não importa de que esporte seja, sabe que qualquer um pode virar bode expiatório quando uma seleção não se encontra.
Isso aconteceu até a Zizinho, o maior de todos os tempos ao meu alcance, mas, injustiça terrível com a posteridade, anterior à era do videoteipe e do marketing.
Por aqueles e por outros modos, a instabilidade de Zagallo, estampada até no próprio rosto - ora duro e agressivamente arrogante, ora vago ou indefeso - projeta-se como força desestruturadora sobre todos os que se sabem dependentes de um comando seguro de si, definido, preparado para tudo o que lhe cabe.
Imagem assim quem a exibe é Zico. Talvez porque sua tarefa a facilite.
Tarefa, por sinal, que até agora ninguém sabe direito qual seja.
Mas que parece, desde o primeiro momento, imaginada exatamente para criar alguma solidez no terreno que Zagallo e seu inseparável Lídio Toledo forraram com areia movediça.
Tal solidez, porém, Zico ainda não conseguiu estendê-la da sua pessoa ao conjunto.
Ou porque, à falta de experiência e do que mais falte, sua solidez só dá para o gasto pessoal, ou porque as circunstâncias mais lhe sugerem poupar-se de desgastes já inúteis.



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