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Africâneres "esquecem" a Holanda
Descendentes dos colonizadores declaram torcida para o Uruguai
FÁBIO ZANINI
DE JOHANNESBURGO
Kobus Gerber é o secretário-geral da Igreja Reformada
Holandesa da África do Sul,
trazida ao país no final do século 17 pelos primeiros colonizadores do país europeu.
Mas hoje, na semifinal da
Copa do Mundo, ele torcerá
para o Uruguai contra a Holanda. "Sou do hemisfério
Sul e estou sempre viajando
para a América do Sul em trabalho missionário", justifica.
Gerber é exemplo do risco
que é tirar conclusões apressadas no complicado mosaico cultural sul-africano. Há
cerca de 3 milhões de descendentes de holandeses hoje no
país (6% da população), chamados de africâneres.
No século 20, foi esse grupo que criou o apartheid, para o qual a Igreja Reformada
Holandesa fornecia questionável base moral e teológica,
igualando os africâneres ao
povo escolhido por Deus no
Velho Testamento.
No papel, deveriam todos
engrossar o coro pró-Holanda, mas hoje, 16 anos depois
do fim do apartheid, a identificação com a pátria-mãe está bem mais diluída.
"Eu me vejo, primeiro, como sul-africano, depois, como africano e, depois, como
descendente de holandês. O
Uruguai jogou muito bem até
agora. Por isso espero que
eles vençam", afirma Gerber.
A igreja que ele representa, com 1,2 milhão de seguidores formais, é "holandesa"
no nome, mas na prática funciona de maneira independente da sua xará europeia.
Estudioso da cultura africâner, o professor Leon de
Stadler, da Universidade de
Stellenbosch (perto da Cidade do Cabo), afirma que os laços culturais existentes com
a Holanda são fortes, mas cada vez menos relevantes.
"Outras formas de afinidade surgem o tempo todo.
Muitos africâneres simpatizam com o Uruguai porque
os consideram os azarões da
Copa", declara o professor.
Do mesmo jeito, negros já
foram vistos no treino da Holanda, sem se preocupar com
o fato de seus ascendentes terem criado o apartheid. "O
fato é que, em 350 anos, os
africâneres criaram uma cultura forte e diferente da holandesa", afirma De Stadler.
A própria língua deriva do
holandês, mas se tornou suficientemente distinta para ser
mais do que um dialeto.
É inevitável que parte dos
africâneres torça pela Holanda, mas dificilmente alguém
o fará cheio de empolgação.
"A Holanda está no nosso
sangue", declara Andre Visagie, ex-secretário-geral da Irmandade Africâner, entidade que luta por uma pátria
branca independente. "Mas
não somos muito de futebol.
Nosso negócio é rúgbi."
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