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FUTEBOL
Goleada e olé dos torcedores
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Alguns dizem que a voz do
povo é a voz de Deus.
No mínimo, é a voz da maioria.
Outros falam que o torcedor é
apaixonado e irracional. É apaixonado, mas não irracional.
Os técnicos de futebol adoram
contrariar os torcedores ou demoram para perceber o óbvio.
Quando o ""bicho pega", os técnicos abaixam a crista e fazem o
que o torcedor pede.
Os mais teimosos dão com os
burros n'água.
Na Copa de 58, os gritos da torcida acordaram o sonolento Feola e, aos poucos, ele escalou os melhores: Didi, Pelé, Garrincha e
Djalma Santos.
Em 62, Aimoré Moreira não
quis frustrar a galera.
Manteve quase o mesmo time
de 58 e trouxe o bi.
Em 66, foi aquela bagunça!
No lugar de escalar os jovens pedidos pela torcida (depois formariam a base da seleção de 70),
Feola dormiu no ponto, ou melhor, no túnel, e preferiu os veteranos. Pensou que fossem eternos.
Em 70, logo que substituiu Saldanha, Zagallo dispensou os craques Dirceu Lopes e Zé Carlos e
barrou Tostão e Piazza.
Coincidentemente, todos mineiros e jogadores do Cruzeiro.
Depois, pressionado pela torcida,
voltou atrás e arrumou um lugar
para os dois últimos.
Em 74, não tinha jeito.
Havia um carrossel holandês no
meio do caminho. Havia, no meio
do caminho, um carrossel holandês. Com a permissão do poeta
maior Carlos Drummond de Andrade.
Em 78, para desagradar à torcida, o científico técnico Cláudio
Coutinho, acredite se quiser, escalou Jorge Mendonça e Chicão nos
lugares de Zico e Falcão.
Coutinho só pensava no ponto
futuro e no overlaping.
Em 82, o mestre Telê pôs os melhores em campo. Não ganhou,
mas brilhou.
Em 86, eu estava envolvido com
a medicina e não acompanhei a
Copa em seus detalhes.
Só me lembro daquele maravilhoso gol do Maradona contra a
Inglaterra. Pra que mais?
Em 90, só o Sebastião Lazaroni
entendia o lazaronês e seu sistema tático.
Em 94, nas eliminatórias, Romário já era o melhor atacante
do mundo.
Quando a situação apertou,
Parreira buscou o baixinho marrento, e ele deu um show de bola
contra o Uruguai, no Maracanã.
Na Copa, Parreira e Zagallo, sabiamente, toleraram as escapulidas e manhas do Romário.
Em 98, Zagallo deixou fora Muller e Mauro Galvão, que estavam
em grande forma, e levou o descontrolado Júnior Baiano e o decadente Bebeto.
Agora, espero que o Wanderley
Luxemburgo tenha compreendido as vaias da torcida no momento da substituição do Alex na partida contra a Argentina.
No Pré-Olímpico, o treinador
atendeu os protestos dos torcedores, e o time se transformou.
Alguns (principalmente os supertécnicos) vão discordar e lembrar que houve momentos em
que o torcedor pediu e os treinadores não atenderam com razão.
Tudo bem, mas isso aconteceu
poucas vezes.
Os torcedores estão dando de
goleada nos técnicos. Com olé e
tudo!
""A tradição é a base da personalidade coletiva de um povo." (Miguel de Unamuno)
Existem as tradições sábias, que
deveriam ser perpetuadas; as simpáticas e gostosas; e aquelas chatas, ultrapassadas, que precisariam ser derrubadas.
A tradição brasileira de dar um
jeitinho em tudo é muito burra,
porque prejudica a maioria a longo prazo.
A tradição dos mineiros de se
reunir às tardes para fazer um
lanche (café com pão de queijo,
mais queijo mineiro) é simpática
e gostosa.
A tradição de numerar as camisas dos jogadores com números de
1 a 11 é básica e não deveria acabar, como lembra o leitor Juan
Saavedra.
A não ser em casos especiais, como o de se imortalizar a camisa
de um supercraque.
Os clubes, empresas e profissionais de propaganda e marketing
querem mudar essa tradição.
Estão colocando, nas camisas
dos jogadores, números grandes
representando os das companhias
telefônicas.
Parece futebol americano.
Nas próximas eleições, não será
surpresa se aparecerem os números dos partidos nas camisas dos
atletas.
Se deixarem, colocam até o retrato do candidato com um largo
sorriso: ""Sou o melhor".
Daqui a pouco, alguns locutores
de rádio e TV, que não perdem
uma oportunidade, vão assim
narrar o jogo: ""Bola com o 21, que
passou para o 23, que lançou o 31,
foi para o 48 e... goooool! É o gol
da comunicação digital e da ligação rápida e barata. Um oferecimento da empresa telefônica X.
Ligue e seja feliz!".
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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