São Paulo, domingo, 7 de junho de 1998

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O rosto da seleção

ALBERTO HELENA JR.
Tenho um amigo tão atarefado que junta os jornais da semana inteira para devorá-los, um a um, nas manhãs de domingo. É para ele -e outros tantos que se utilizam desse artifício para recuperar o tempo perdido no trânsito insuportável das nossas grandes cidades- que envio estas mal traçadas, um balanço da semana da seleção.
Lembro-me de que, pouco antes de embarcar para cá, no seu programa da Manchete, Salomão Schwartzman pediu-me uma mensagem final. Foi quase uma prece: Zagallo, treine esse time, treine, treine, treine. E treine.
Claro, pois, se temos uma constelação de craques de brilho tão intenso a ponto de cegar qualquer outro concorrente, só o que nos falta é conjunto.
Logo, se treinarmos devidamente, intensamente, corretamente, vamos pular na dianteira dos demais adversários, com vários corpos de vantagem, na corrida em direção à taça.
Pois não treinamos nem devidamente, nem intensamente, tampouco corretamente. Nossos exercícios com bola foram poucos -em relação ao tempo disponível e ao tempo necessário- e mal orientados.
Para se ter uma idéia, fizemos apenas dois coletivos e só na manhã de sexta-feira tentamos executar algumas repetições de jogadas ensaiadas.
Em contrapartida, tivemos aquele patético espetáculo do jogo-treino contra Andorra -o das placas da Traffic- e aquela armação da Nike, que nos comeram dois dias de inteiro ócio.
Neste caso específico -o do jogo dos negócios-, quero adiantar o seguinte: ninguém antes de mim, tampouco, depois, com mais ardor, defendeu tanto a transformação do futebol brasileiro numa grande empresa de entretenimento de massa. Que me perdoem os duros, mas dinheiro é fundamental, diria o poetinha se ainda estivesse entre nós.
Mas parece que conseguimos, neste caso, nos identificar apenas com o lado mercantilista, predatório, do negócio. A face que começa a dar contorno a esta seleção sem rosto, como bem cunhou esta Folha dias atrás.
Só espero que nossos craques consigam resgatar a face lúdica e cristalina, do futebol das nossas esperanças.



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