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Começa Copa do bastidor
HUMBERTO SACCOMANDI
enviado especial a Paris
A Fifa (Federação Internacional
de Futebol Association) começa a
decidir hoje o sucessor do brasileiro João Havelange, que preside a
entidade desde 1974.
A escolha ficará a cargo do 51º
Congresso da entidade, que começa em Paris e vai até amanhã,
quando representantes de 192 países-membros com direito a voto
vão eleger entre o suíço Joseph
Blatter (candidato de Havelange) e
o sueco Lennart Johansson.
Não se trata só de uma disputa
esportiva. A Fifa controla um dos
mais valiosos negócios do planeta:
o jogo mais popular e o evento
mais visto pela TV (a Copa do
Mundo supera a Olimpíada).
Para Havelange, o impacto
anual do futebol na economia
mundial chega a US$ 260 bilhões.
O valor pode ser superestimado,
mas dá uma idéia de dimensão.
Suas decisões afetam a atividade
de milhares de clubes profissionais, empresas (as que patrocinam o esporte, de material esportivo, de marketing), organizações
de mídia e milhões de jogadores
(profissionais e amadores).
Diretamente, a Fifa vai administrar cerca de US$ 4 bilhões entre
direitos de TV e arrecadação de
público de seus torneios nos próximos oito anos e contratos de patrocínio, cujos detalhes a Fifa se
recusa a revelar.
Ao controlar o esporte, a Fifa direta ou indiretamente influencia a
vida de 200 milhões de jogadores
de futebol (amadores e profissionais) pelo mundo, sendo 40 milhões de mulheres. Sem falar nos
bilhões de torcedores.
Todo esse poder fica em grande
parte concentrado nas mãos do
presidente, já que o principal órgão da Fifa, o comitê executivo, se
reúne somente duas vezes por
ano.
Esse homem se torna uma mistura de secretário-geral da ONU
(Organização das Nações Unidas)
e de presidente de uma multinacional. "Não estou aqui para ver
belos jogos. Estou aqui para administrar a Fifa como uma empresa.
A Fifa é um poder", disse ontem
Havelange, em entrevista coletiva.
Não impressiona, assim, que
Blatter (secretário-geral da Fifa) e
Johansson (presidente da Uefa, o
órgão do futebol europeu) disputem com tanto empenho um cargo
que nem remunerado é, numa associação sem fins lucrativos.
O sueco baseia sua campanha na
necessidade de dar mais democracia e transparência às decisões e
aos negócios de Fifa, marcados
por suspeitas de favorecimento no
reinado de 24 anos de Havelange.
O suíço diz que a Europa quer
reaver o controle do futebol mundial e privilegiar os países ricos,
em detrimento de América Latina,
Ásia e África (desde sempre a base
de poder de Havelange).
Outro importante ponto de discórdia diz respeito à Copa de 2006.
Johansson a quer na Alemanha
(país que banca sua candidatura).
Blatter a prometeu para a África
do Sul. Depois seria a vez da América Latina. Só em 2014 a Copa voltaria para a Europa.
A campanha foi marcada pela
troca de acusações e ausência de
"fair play" (o jogo limpo que a
Fifa incentiva em campo).
O grupo de Johansson fez circular um panfleto anônimo com
acusações contra Blatter, durante
a última reunião do comitê executivo da Fifa, há duas semanas.
Este, por sua vez, esperou até o
último momento para se declarar
candidato. Assim, pode viajar pelo
mundo como secretário-geral, à
custa da Fifa, divulgando a sua
candidatura.
Os dois candidatos, como é de
costume em eleições, dizem ter a
maioria dos votos. Blatter fala em
112. Johansson, em 111. Como a
soma dá 223 (e não 192), ou alguém está superavaliando suas
chances, ou o índice de traição
eleitoral será muito alto.
Traições essas que, segundo
acusações de ambas as partes, estão sendo estimuladas pelas promessas de benefícios futuros.
Três meses atrás, a candidatura
de Johansson parecia imbatível.
Tinha o apoio da Europa, da África e de boa parte da Ásia.
Hoje, o favoritismo parece estar
com Johansson, que assegurou o
apoio das Américas, de parte da
África e da Ásia e vem conseguindo importantes cisões na Europa,
como a França e a Inglaterra.
Se vencer, o poder de Havelange
na Fifa deve sobreviver ao seu
afastamento da Presidência.
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