São Paulo, Domingo, 07 de Novembro de 1999
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A criação de Pelé


As jogadas extracampo do atleta do século



A estratégia para consolidar a imagem de sucesso construída dentro de campo, com as maiores conquistas obtidas na história por um jogador de futebol, só foi concretizada a partir da união com João Havelange no final dos anos 60


JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
da Reportagem Local

Edson Arantes do Nascimento nasceu em 23 de outubro de 1940, em Três Corações (MG), mas Pelé só surgiria quase dez anos depois.
Apesar de o apelido ter sido inventado por volta de 1947, o nascimento de Pelé deu-se na tarde de 16 de julho de 1950, enquanto ouvia em Bauru (SP) a transmissão da final da Copa daquele ano, entre Brasil e Uruguai.
""Foi um dos dias mais tristes da minha infância. A festa já estava preparada, todos achavam que o Uruguai não tinha chances, ainda mais jogando no Maracanã. Quando terminou o jogo e eles venceram (2 a 1, de virada), senti como se tivesse perdido um parente", contou à Folha.
""Ao mesmo tempo, veio uma sensação gozada, de não querer que aquilo se repetisse mais. Foi aí que decidi ser um jogador que fizesse diferença, que trouxesse a alegria que os uruguaios nos roubaram daquela vez. Foi aí que o Pelé realmente começou."
Essa origem como um herói vingador é uma das criações em torno do mito Pelé, que o próprio jogador, sócios, familiares e dirigentes souberam construir: o atleta do século que se aposenta cedo, vira empresário bem-sucedido e, depois, ministro que moderniza o esporte no Brasil.
Mas a história do ex-jogador, que será homenageado no ano que vem pela Fifa como principal destaque do futebol no século, nem sempre foi tranquila.
Documentos do governo militar (1964-1985), hoje em mãos de um ex-integrante do regime, mostram que empréstimos da CBD (Confederação Brasileira de Desportos, atualmente Confederação Brasileira de Futebol) ajudaram Pelé a recuperar sua situação financeira depois de vários fracassos empresariais no final dos anos 60.
João Havelange, comandante da entidade na época, fez um acordo velado com o então jogador que catapultaria o dirigente à presidência da Fifa em 1974, cargo máximo do futebol mundial, ocupado por ele até o ano passado.
Em troca do apoio à sua candidatura, Havelange, além de emprestar dinheiro da CBD para Pelé, atuou como ""agente'" do jogador em sua carreira de garoto-propaganda de multinacionais como Pepsi e Adidas e ajudou a aproximá-lo do governo norte-americano.
A relação entre Pelé e Havelange, estremecida a partir da década passada, chegou a ser tão intensa nos anos 60 e 70 que o governo militar colocou agentes secretos para seguir os movimentos do jogador, especialmente quando ele viajava ao exterior.


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