São Paulo, sexta-feira, 07 de dezembro de 2007

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XICO SÁ

Vida, à vera, só na Segundona


Futebol, no sentido que foi inventado, com feições de uma peleja que imita a vida, é da Série B para baixo


A MIGO TORCEDOR , amigo secador, Série A, sem nenhum preconceito contra as meninas, é futebol de moça grã-fina.
É aquela bolinha de lado, é aquele toquinho, ui, ai, passa a pelota, é aquela firula, todo mundo tirando a perna da dividida, todo mundo querendo ir para a Europa, é quase um balé na sua coreografia à Mikhail Baryshnikov. Como diria o velho Costinha, com a sua imoral bocarra das antigas: "Nooooossa!".
Futebol, no sentido que foi inventado, com feições de peleja que imita a vida, é da Série B para baixo. Por isso não entendo o redemoinho todo que se faz acerca da queda do Corinthians. Não há humilhação, e nada mais parecido com time de massa do que o "glamour popular", como no título do sensacional gibi do Caeto, do que o faroeste da Segundona.
Até o papagaio do amigo Marquinhos, que na gaiola outro dia cagava sobre uma folha da imprensa burguesa com a manchete da queda alvinegra, sabe disso. É, Florbé 2º, amigo, como é chamado o nobre bípede, santista roxo -apesar de ter a cor do Palmeiras-, manja da gangorra da existência como poucos. Ainda mais de uma queda para o alto, como esta, que funciona como um purgatório para a alma. A vida, como dom Paulo César Campos Viejo, chapa da noite e da sinuca, diz aos filhos, "é cada vez menos". Só os tolos acham que planejam, ganham e acumulam. Coitados, já, já a Velha da Foice passa a régua e mostra-lhes o prejuízo. Só rindo deles, como o faz Edgar, meu santo corvo. Mas não carecia risada tão sinistra, velha ave agourenta. Até mesmo porque, Mr.
Never More, secaste horrores o time corintiano. "Eis meu ofício, não sou falso, pobre cronista, besta de quem torce por uma camisa se tem a chance de secar tantas outras", grasna no seu novo poleiro, presente natalino. "Ora, noves fora o Washington Olivetto, todo corintiano é antes de tudo um rebaixado por Deus", insiste o diabo do corvo, eterno ateu ressentido de classe, um corvo, além de lazarento, marxista, amigo, vê se posso conviver com criatura dessas!
Como se não existissem lascados em todas as torcidas do mundo. Foi-se o tempo em que clubes de origem dita nobre, ponha aspas nisso, amigo, como o Fluminense, o São Paulo, o Náutico, só tinham burgueses na torcida. Hoje praticam a mais saudável das democracias ludopédicas.
"Não passo do teu inconsciente com penas negras", diz o traste que amo, sim, o corvo, para me responsabilizar pelo escrito. "Capaz de vôos condoreiros e ignorâncias barrocas", o peste saca a alma do pobre dono. O que mais impressionou Edgar, porém, foi Mano Menezes. Que firmeza de mosqueteiro. Tem toda a razão quando diz que a Segundona é mais emocionante e épica do que um suposto quarto título do São Paulo na Libertadores. Na série B todas as batalhas são dos aflitos.
Mas quem se deu bem mesmo foi o motorista do ônibus da Lusa, como avisa o Américo. Acaba de ser contratado, com baita aumento, pelo Corinthians. A equipe carece de um timoneiro que saiba o caminho do estádio de Barueri, de Campinas, de Santo André, de Marília... Além de tudo é motorista pé-quente, o time do Canindé está de volta à suposta elite. Não pode mais é, um clube tão grande, ser guiado por Deus e dirigido por Dualibs. O resto vale.

xico.folha@uol.com.br


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