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desperdício
Tênis do Brasil não vê legado de Guga
Dez anos após primeiro título de Roland Garros, modalidade mostra que não aproveitou quase nada da onda do ex-nš 1
País não tem top 100, não é
campeão desde 2004, vê número de jogadores voltar ao patamar pré-Kuerten e
perde fábrica de raquetes
FERNANDO ITOKAZU
LUÍS FERRARI
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma década depois de Gustavo Kuerten conquistar seu
primeiro título em Roland Garros, o tênis brasileiro não tem o
que comemorar.
Enquanto o catarinense, que
não programou nada de especial para hoje, seguirá treinando em Camboriú (SC), a comunidade do tênis nacional observará a efeméride lamentando o
fato de a modalidade ter desperdiçado a chance de catapultar sua presença na cena esportiva brasileira propalada pelo
grande sucesso do ídolo.
Atletas, dirigentes e os principais personagens do mercado
nacional do tênis são unânimes
na avaliação: dez anos depois
de o cabeludo surfista do saibro
colocar o Brasil no mapa da
modalidade, o legado para o tênis nacional é quase nulo.
"É um pouco frustrante ver
que praticamente nada foi feito. O esporte em si se popularizou, surgiram muitos projetos,
mas não houve um desenvolvimento de um programa qualificado", lamenta Guga, que nesse
período ganhou outros dois títulos no Aberto da França e foi
número um do mundo.
O diagnóstico de que o efeito
Guga foi uma onda que passou
sem deixar rastros permeia a
elite do esporte, a prática amadora nas academias e as lojas de
material esportivo.
O período ficou marcado pela
pior crise política do tênis nacional. Alegando discordar do
trabalho de desenvolvimento
no país, os principais tenistas
do país, liderados por Guga,
boicotaram a Copa Davis, o que
levou o país à terceira divisão
do torneio. O boicote só acabou
com a saída de Nelson Nastás
da CBT (Confederação Brasileira de Tênis), no fim de 2004.
"O Guga deu um grande impulso ao tênis, mas também o
destruiu ao boicotar a Davis.
Puseram na cabeça dele que
não estava sendo feito nada",
afirma Nastás. "Mas o trabalho
de estrutura e base foi feito."
Se foi feito, não está dando
resultado. Entre os profissionais, o Brasil não conta atualmente sequer com um top 100,
e o último título relevante na
ATP foi em setembro de 2004.
"O fenômeno Guga gravou
como tatuagem, mas não existe
continuidade", diz Carlos Gonçalves, vice-presidente da federação paulista. A entidade tinha
entre 4.500 e 5.000 filiados ativos em 1996, foi a 7.000, e agora
voltou ao patamar pré-Guga.
O surgimento do ídolo provocou uma euforia que aqueceu
o mercado no início. Mas sem
consolidar seu crescimento.
"O sucesso do Guga foi acompanhado por um "boom" de novas academias. Hoje, muitas fecham as portas. Com a concorrência das quadras que se espalham por condomínios, talvez o
mercado esteja pior do que antes de 97", diz Glauco Pereira,
coordenador técnico da rede de
academias Play Tennis, uma
das mais antigas do país.
O mercado de raquetes confirma a análise. Paulo de Tarso,
diretor-geral da Head Brasil,
conta que a empresa deixou de
abrir uma fábrica em Manaus.
"Tínhamos estudo para fabricar para toda a América Latina
no Brasil. Com a queda do mercado, ficou inviável. A Head decidiu fabricar na China."
Em 2001, ano que começou
com Guga como número 1 do
mundo, foram vendidas 200
mil raquetes. Em 2006, 130 mil.
Nora Vallejos, presidente da
Wilson no Brasil, conta que
houve uma migração de tenistas amadores inicialmente motivados pelo efeito Guga.
"Na época, muitos garotos de
14, 15 anos começaram inspirados em Guga. Esse consumidor,
hoje com 25 anos, passou para
outros esportes, como corrida
de rua e corrida de aventura."
"A gente é responsável por
esses dez anos em que não foi
feito nada", afirma o atual presidente da CBT, Jorge Lacerda
da Rosa, citando dirigentes,
treinadores, jogadores e mídia.
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