São Paulo, domingo, 08 de setembro de 2002

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Participação brasileira teve lobby de Havelange

DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil não seguiu Argentina, Chile e Paraguai e decidiu participar dos Jogos Olímpicos, rompendo o boicote imposto pelos EUA. E uma das razões foi João Havelange, que, no início de 1980, quando os norte-americanos pressionavam os brasileiros para não irem a Moscou, defendeu nos bastidores a participação do país.
O então presidente da Fifa, que na época exercia seu segundo mandato na entidade que rege o futebol, associou-se a Juan Antonio Samaranch para convencer vários países a participarem do evento. Três dias antes da cerimônia de abertura, o espanhol assumiria a presidência do Comitê Olímpico Internacional.
Ex-embaixador de seu país na então União Soviética, Samaranch, quando em campanha, trabalhou muito para evitar que boa parte das nações da Europa Ocidental esvaziasse os Jogos.
Esvaziá-los significaria não só enfraquecer o Movimento Olímpico, mas especialmente a Adidas e a agência de marketing esportivo criada pelo alemão Horst Dassler, aliado de Havelange na Fifa e o principal financiador da campanha do espanhol no COI.
Afastado da CBD (Confederação Brasileira de Desportos, atual CBF) pelo governo de Ernesto Geisel (1974-1979), Havelange tinha melhor relacionamento com o general João Baptista Figueiredo (1979-1985) e manteve com ele três reuniões para defender a participação nos Jogos Olímpicos.
A partir de 1974, quando o brasileiro ganhou as eleições e assumiu a presidência da Fifa, Dassler, que a princípio apoiara Stanley Rous, inglês que comandava a entidade, mudou de lado. Associou a Adidas à Fifa e, três anos depois, passou a trabalhar, com Havelange, pela candidatura de Samaranch à presidência do COI.
O plano era ambicioso. A idéia era montar no comitê a mesma estrutura da Fifa, modernizada e administrada empresarialmente a partir de 1974, que começou a dar lucro, principalmente para a Adidas -em 1987, ano em que Dassler morreu, a marca alemã faturava US$ 2,2 bilhões por ano.
Em 1980, o empresário montou o embrião da ISL -International Sports Leisure-, que se tornaria mais tarde a agência da Fifa, do COI e da Iaaf, entidade que organiza o atletismo e era chefiada pelo italiano Primo Nebiolo.
Depois de Montréal-76 ter terminado com enorme prejuízo -superior a US$ 1,6 bilhão-, a plataforma de Samaranch era tornar os Jogos lucrativos como as Copas. Quanto mais forte fosse o boicote -inclusive a Los Angeles-84, desta feita pelo bloco comunista-, menor o lucro. Em 1980, por exemplo, os direitos de TV, que chegaram a US$ 185 milhões, foram renegociados, após o boicote, para US$ 122 milhões.
Além de Havelange, o mexicano Mario Vásquez Raña, presidente da Associação de Comitês Olímpicos Nacionais, e Primo Nebiolo trabalharam para tentar reduzir o boicote aos Jogos de 1980, conseguindo apoio de países como Áustria, Austrália, Brasil, Colômbia, França, Holanda e México.
Dos três, Havelange foi quem mais teve sucesso, fazendo um trabalho elogiado por Samaranch e Dassler com os países africanos, que ajudaram a elegê-lo em 1974.
Com apoio do trio, o alemão adquiriu a Le Coq Sportif em 1977 e tentou alavancar a empresa de material esportivo na França associando-a aos Jogos de 1980. O boicote, então, seria um desastre.
Correspondências trocadas entre Havelange e Figueiredo, com menção ao trabalho de Nebiolo no continente europeu e de Vásquez Raña na América Central, no México, na Ásia e na Oceania, hoje parte do arquivo deixado pelo ex-ministro Roberto Campos, mostram que o objetivo era reunir no mínimo 92 países em Moscou, mesmo número atingido em Montréal, quatro anos antes.
Não deu certo. Mesmo assim, com apenas 81 países, os Jogos de Moscou tiveram melhor resultado: terminaram com lucro. (JCA)


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