São Paulo, quarta-feira, 08 de setembro de 2004

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FUTEBOL

A leveza do Parreira

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

As partidas da seleção no Brasil se transformaram em festa para políticos, celebridades que gostam ou não de futebol e para torcedores da classe média e rica. Os pobres não podem mais assistir nos estádios aos jogos do time brasileiro.
A fragilidade da Bolívia não apaga o show que o Brasil deu em alguns momentos. A Alemanha é inferior, mas, em casa, será um adversário difícil. Hoje vamos conhecer melhor a nova formação com os dois Ronaldos e Adriano. Se o Brasil e os três tiverem ótimas atuações, Kaká poderá perder a posição de titular.
Prefiro Kaká (ou Alex) e os dois Ronaldos. Mais importante é saber que nenhuma seleção do mundo tem tantos craques do meio para a frente. Parreira poderá utilizar todos, com freqüência, de acordo com o momento.
Alguns acham que a seleção, por ter três craques mais à frente e dois laterais que apóiam bastante, precisa de três volantes. Concordo, desde que dois deles marquem e avancem como meias. Após a entrada do Juninho, o time ficou mais ofensivo e criativo, sem piorar a marcação.
Contra boas equipes, a presença de três volantes muito preocupados com a defesa, dois centroavantes e apenas um meia para organizar as jogadas, a seleção poderá se tornar muito previsível e lenta na saída de bola para o ataque. Gilberto Silva e Edu possuem pouca mobilidade e habilidade para saírem de uma marcação mais forte.
Há também situações de jogo em que é melhor trocar um volante por um terceiro atacante, pela ponta. Será que foi isso que o Parreira pensou para o futuro, ao colocar o Robinho no ataque, pela direita, no lugar do volante Edu? Mas os melhores momentos do Robinho no Santos são pela esquerda, entrando em diagonal para o meio.
O fácil jogo contra a Bolívia seria uma ótima oportunidade para alguns jogadores, como Edu e Beletti, brilharem individualmente e ganharem mais prestígio e confiança. Não foi o que aconteceu. Ficou mais evidente que Cafu e Zé Roberto fazem falta.
A escalação de novos jogadores na Copa América, o título conquistado e a posição tranqüila nas eliminatórias parecem ter dado a Parreira mais confiança e leveza para ousar e criar variações táticas e individuais. Isso é ótimo.

Momentos diferentes
Na Olimpíada, ficou mais evidente a precária renovação do futebol europeu. Itália e Portugal tiveram más atuações e eram, teoricamente, as mais fortes seleções olímpicas da Europa, já que foram as classificadas.
A França, sem Zidane e outros que se despediram da seleção, jogou muito mal no empate por 0 a 0 contra Israel, pelas eliminatórias da Copa de 2006. Isso deixou os torcedores franceses muito preocupados. O mesmo acontece no restante da Europa.
Enquanto isso, Brasil e Argentina não param de revelar excelentes jogadores. Quase todos os titulares olímpicos da Argentina atuam na seleção principal. A seleção brasileira tem hoje a mesma qualidade individual que tinha nos seus melhores momentos. A diferença é o Pelé.
Mas é preciso separar a seleção brasileira, que brilha há vários anos por causa de seus craques, do futebol brasileiro, que há muito tempo vive maus momentos, dentro e fora de campo. A CBF, juntamente com a maioria das federações estaduais e dos dirigentes de clubes, pode ter sido eficiente para as seleções. Foi, porém, ruim para o futebol brasileiro.

Críticas e críticos
Como no Brasil o mais comum é endeusar nas vitórias até as coisas ruins e achar tudo errado nas derrotas, os cronistas que não analisam apenas um momento, e que percebem virtudes quando se perde e deficiências quando se ganha, são vistos por muitos jogadores, técnicos, dirigentes e pela mídia festiva como mal-humorados, pessimistas e ranzinzas.
Quando um atleta, que era corretamente criticado, faz uma ótima partida, alguns jornalistas adoram dizer que o jogador "calou a boca dos críticos". Nada mais bobo. Se esse atleta melhorou, ótimo. Vamos elogiá-lo, sem fazer nenhuma análise definitiva por apenas um ou poucos jogos.
Não é fácil ser comentarista, crítico, num país que tem a seleção pentacampeã do mundo. Para a turma do oba-oba, tudo é maravilhoso. Os analistas de países cujas seleções perdem muito mais do que ganham devem ser muito mais bem aceitos.

E-mail
tostao.folha@uol.com.br


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