São Paulo, sábado, 08 de novembro de 2003 |
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Para respeitar religião muçulmana, atletas ganham permissão para ocultar corpo durante Copa do Mundo Egípcias cobrem com véu o esporte que louva o corpo
MARIANA LAJOLO DA REPORTAGEM LOCAL De véu na cabeça e corpo totalmente coberto, as egípcias terminam uma de suas orações e se encaminham para o principal compromisso do dia: o jogo de vôlei. A cena tem se repetido em todas as rodadas da Copa do Mundo. Para que a religião muçulmana pudesse conviver com uma competição que também faz seu marketing em cima das beldades, a seleção do Egito ganhou autorização para usar um uniforme especial que permite às mais ortodoxas não mostrarem o corpo. Foi apenas mais um passo em uma convivência que já havia se tornado pacífica nas quadras. Algumas atletas egípcias jogam com véus na cabeça, camisetas de manga longa, meias e bermudas compridas. Apenas o rosto e as mãos ficam expostos. "Jogar assim é uma opção. Faço isso para proteger o meu corpo dos olhares das outras pessoas", afirmou Mona Badawy à Folha, por telefone, de Toyama (Japão). "Já me acostumei. Sempre treino assim. E também é a roupa que uso na vida normal", acrescentou a atacante de 21 anos, que pratica vôlei desde 1995 em seu país. Além dela, outras duas atletas, a meio Neamat Badawy, 22, e a levantadora Yosra Selim, 22, seguem o mesmo caminho. As demais usam só bermudas longas. Enquanto o vôlei cede com o uniforme, as jogadoras procuram flexibilizar a rígida rotina diária de orações. São cinco durante o dia: pela manhã, ao meio-dia, à tarde, ao pôr-do-sol e à noite. "Nossos treinos não acontecem nesses horários", disse Mona, que conta com uma "folga" quando o assunto são as competições. "Deus sabe dos compromissos da nossa vida. Se tivermos de jogar na hora das orações, podemos rezar antes ou depois dos jogos." A persistência das jovens muçulmanas -o time tem média de 20 anos- tem mantido o vôlei do país vivo na cena internacional. Afastada dos principais torneios desde a Copa do Mundo de 1995, a seleção se classificou para o Mundial-2002 e para a Copa-2003, graças ao título africano. Na competição alemã, o Egito amargou a lanterna ao lado de Austrália, Quênia e México. No Japão, segue esse caminho. Até agora, não venceu nenhum set. "Estamos aqui para aprender. Já é um grande feito jogar contra times tão fortes como Brasil e China", declarou Mona, que passa os dias tentando equacionar seu tempo entre orações, treinos, jogos e o curso de administração. Preconceito por praticar o esporte, diz que nunca sofreu. "Todas as meninas podem jogar vôlei. É uma atividade normal. O Egito quer que as mulheres pratiquem esportes, não importa se são religiosas ou não", afirmou. Na madrugada de hoje, as africanas duelariam com o Brasil. Se não causavam preocupação nas brasileiras por causa de seu baixo nível técnico, Mona e suas companheiras despertaram admiração e curiosidade. "Eu achei o máximo. Elas respeitam sua cultura. Nunca havia jogado contra um time assim", disse Virna. "Mas eu olhava para o jogo delas no vídeo e só conseguia pensar em como conseguem jogar suando embaixo dos véus." Ao entrar em quadra hoje -com short curto e camisa justa, como manda a federação internacional-, o Brasil sentiria o contraste com sua última partida. Contra Cuba, enfrentou o único selecionado que ainda veste o símbolo de uma das maiores polêmicas envolvendo a FIVB. A entidade que autorizou o Egito a usar uniforme especial já foi acusada de querer "sexualizar" o esporte. Em 1998, a FIVB multou equipes -entre elas o Brasil- que se recusaram a usar o modelo "macaquinho" (tipo de maiô grudado ao corpo) no Mundial. Na época, as brasileiras apelidaram a peça de "É o Tchan" e condenaram a exposição do corpo. Texto Anterior: Painel FC Próximo Texto: Revanche da era Motta motiva remanescentes Índice |
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