São Paulo, domingo, 10 de janeiro de 1999

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AUTOMOBILISMO
Ex-professor de esqui e executivo de empresa japonesa, Craig Pollock, da BAR, espera vencer neste ano
"Intruso' quer mudar a imagem da F-1



FÁBIO SEIXAS
da Reportagem Local

A história da F-1 é repleta de aventureiros. Empresários pretensiosos, grandes corporações e jovens pilotos surgem periodicamente prometendo sucesso e glória fulminantes na categoria.
Na era romântica do automobilismo, dos anos 50 aos 70, esse ímpeto até funcionava.
À medida que a F-1 apertou o passo rumo à profissionalização, porém, mais raros são os êxitos, mais frequentes os fiascos.
Basicamente, são dois os motivos. Primeiro, todo o desenvolvimento tecnológico tornou a categoria cada vez mais cara. Segundo, as equipes já estabelecidas oferecem resistência à entrada de novas sócias no clube, o que significaria repartir o bolo com um "intruso".
A lista de fracassos é extensa e inclui times como Andrea Moda, Eurobrun, Life, Monteverdi, Forti e Lola, para ficar só na década de 90.
Na semana que passou, a F-1 começou a conhecer a mais nova pretendente a "intrusa" do clube das grandes equipes.
A BAR (British American Racing) promoveu seu lançamento oficial, adotando, como suas antecessoras, um discurso otimista.
Ao contrário dos casos mais recentes, porém, demonstra ter cacife para sustentá-lo.
A BAR é fruto da união de fortes grupos. Garantiu o fornecimento dos motores Supertec e é capitaneada por Craig Pollock, um yuppie escocês de 42 anos, com uma trajetória curiosa.
Pollock formou-se em esportes e biologia na Universidade de Glasgow, em 1977. No mesmo ano, começou a dar aulas de esqui.
Em 1982, lecionava na Suíça, quando começou a se aproximar de um de seus alunos, o canadense Jacques Villeneuve, então um pré-adolescente de 11 anos.
Em 1986, foi contratado pela multinacional japonesa Interhoba e iniciou seu contato com a F-1. Ali, tornou-se consultor da Honda, representante europeu do autódromo de Suzuka e negociador dos direitos de TV para a categoria.
Em 1993, mais uma vez sua vida cruzou com a de Villeneuve, então na F-3 japonesa. Pollock deixou a Interhoba e tornou-se empresário do canadense.
A gênese da BAR é seu passo mais importante. Dono de idéias ambiciosas, como a de pintar seus carros com patrocinadores diferentes, encontra resistência de setores mais conservadores da F-1.
De seu escritório, em Brackley, Inglaterra, Pollock falou à Folha sobre seus planos, suas expectativas e sua dupla de pilotos: Villeneuve e o brasileiro Ricardo Zonta.
Folha - Como vem sendo seu relacionamento com outros chefes de equipe?
Craig Pollock -
Está ficando mais forte à medida que o tempo passa. No início, talvez minha relação com eles fosse muito recente para que me convidassem para o clube. Agora, eles perceberam que nosso projeto é positivo e vêm mostrando mais respeito.
Folha - Você chegou a sentir algum tipo de aversão a suas novas idéias para a F-1?
Pollock -
No início, sim. Mas é surpreendente como certos donos de equipe são abertos a ouvir idéias de outros donos de equipe, que querem melhorar o esporte.
Folha - Você já atuou na Indy. Quais são as diferenças nesse relacionamento entre equipes?
Pollock -
As diferenças são enormes. A F-1 é um esporte global de participação restrita, enquanto a Indy é uma amigável categoria norte-americana.
Isso basicamente quer dizer que, na F-1, é um pouco mais difícil estabelecer relações confiáveis com outras equipes ou pessoas.
Folha - Você já recebeu alguma resposta da FIA (entidade máxima do automobilismo) sobre sua intenção de usar dois carros com patrocinadores diferentes?
Pollock -
A situação é a seguinte: nós não pedimos à FIA para correr com dois carros diferentes. O que fizemos foi questionar a FIA sobre os direitos comerciais dos times da F-1, especificamente a pintura das carenagens. O que posso dizer é que só queremos estar certos dos limites comerciais para o futuro.
Folha - Mas será possível correr com carros diferentes neste ano?
Pollock -
Vamos ter de esperar para ver...
Folha - Sobre Ricardo Zonta...
Pollock -
Quem é esse? (risos)
Folha - Como vocês chegaram ao nome dele e como foram as negociações para contratá-lo?
Pollock -
As negociações com seu empresário, o senhor Geraldo Rodrigues, foram muito diretas e corretas, como eu esperava.
Há duas razões pelas quais escolhemos Ricardo Zonta em vez de outro piloto mais experiente. Obviamente, há poucos pilotos experientes, e existe muita diferença de nível entre eles.
Mas a principal razão é que nossa primeira opção foi Jacques, e o que queríamos agora era um piloto jovem, agressivo. Foi pensando nisso que começamos a pesquisar e chegamos ao nome Ricardo Zonta. Ele tem tudo para ser um piloto de ponta no futuro. Com uma pequena ajuda do Jacques, acreditamos que ele pode chegar lá.
Folha - Por razões óbvias, no Brasil pouca gente acredita que Jacques Villeneuve e Ricardo Zonta terão tratamentos e carros iguais dentro da equipe. Como vocês vão controlar isso?
Pollock -
As mesmas condições, os mesmos equipamentos... Deixamos claro para Ricardo que não haverá um primeiro piloto na equipe. Será como o esquema da Williams, não como o da McLaren ou o da Ferrari.
O que temos que fazer, na prática, é ter certeza de que poderemos parar os dois carros nos pits com a mesma eficiência. No início, nos primeiros dias, acho que só o Jacques vai testar, porque só teremos um carro. Ele é mais experiente, tem mais condições de passar informações para os engenheiros e depois poderá ajudar o Ricardo.
Folha - A história recente da F-1 mostra que não é fácil comandar uma equipe nova na categoria, mesmo quando um grupo compra uma estrutura já existente. Foi o caso da Arrows e, agora, é seu caso, adquirindo a Tyrrell. Realisticamente falando, que times você espera que serão seus rivais em 99?
Pollock -
Os rivais no próximo ano serão McLaren, Ferrari e acho que Jordan estará lá também.
Folha - Mas falando sobre seus rivais diretos?
Pollock -
Estou dizendo que essas equipes serão nossas rivais diretas. Acho que a Williams provavelmente vai descer ladeira abaixo. E acredito que nós estaremos entre as quatro melhores.
Folha - Vocês pensam em vencer corridas no primeiro ano?
Pollock -
Não estamos só pensando em vencer corridas. Nosso objetivo real é vencer corridas, e todo mundo na empresa acredita que teremos um pacote técnico e de pessoal capaz disso. Para isso, temos que tentar ser consistentes, competitivos ao longo de toda essa nossa primeira temporada.
Folha - Como você define sua participação no Mundial no próximo ano?
Pollock -
Vai ser um ano de muito aprendizado para mim. Terei de concentrar meus atos na direção da equipe. E eu tenho convicção de que nós podemos criar uma nova maneira de as pessoas olharem para a F-1. Uma nova imagem para a categoria.
Folha - No início de 98, o senhor Max Mosley (presidente da FIA) concedeu uma entrevista à Folha e disse que não via o caso de vocês, um grupo de cigarros comprando uma equipe, como uma tendência da F-1 para escapar das restrições à publicidade tabagista. Qual é sua opinião?
Pollock - Concordo com ele. Não se trata de um fenômeno exclusivo da área de cigarros, para escapar dessas restrições.
É, sim, algo que acontecerá cada vez mais, envolvendo grandes patrocinadores. No futuro, veremos grandes empresas estabelecendo contratos longos, de cinco, dez anos, com as equipes.



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