|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FUTEBOL
Jogador que protagonizou uma das maiores "zebras" das Copas, morto pela ditadura, é homenageado em selo
Haiti reconhece, agora, herói da Copa de 50
LUIZ CESAR PIMENTEL
da Reportagem Local
Na década de 40, o futebol fez Joseph Nicolas Gaetjens superar os
problemas de ser imigrante nos
EUA. Em 50, protagonizou uma
das maiores zebras da história do
futebol. Virou herói em seu país, o
Haiti, onde acabou desaparecendo
misteriosamente. Agora, Gaetjens
será "reconhecido", com o lançamento de selos do governo local.
Segundo seu irmão, Jean Pierre, a
homenagem a Joe, como era conhecido, tem uma conotação diferente: o reconhecimento como
merecedor de figurar em estampas
oficiais haitianas não veio só pela
façanha na Copa, disputada no
Brasil, mas como espécie de "confissão" do governo por sua morte.
Em 50, jogando pelos EUA, Joe
marcou o gol de uma das maiores
"zebras" da história das Copas, a
vitória norte-americana sobre a
Inglaterra, por 1 a 0. Na repercussão mundial da partida, Joe foi levado de carona.
Cerca de 14 anos depois, já de
volta a seu país, foi preso durante o
regime de François Duvalier, o
"Papa Doc", e, segundo seu irmão,
acabou morto em Fort Dimanche,
campo de tortura à época.
No final de 98, Jean Pierre conseguiu que imagens daquela partida
e da carreira do ex-atleta virassem
selo nacional no Haiti.
Linha-dura
De família politizada, Joe era o
menos predisposto a sofrer represálias durante a época em que o
país foi governado pela família Duvalier, entre 57 e 86.
Em 71, François Duvalier foi sucedido pelo filho Jean-Claude, conhecido como "Baby Doc", e que
daria sequência ao regime nos 15 anos seguintes.
"Joe era um herói,
mas nossa família era
conhecida por suas posições contrárias ao regime", diz Jean Pierre.
A mãe foi uma das
fundadoras da "Liga
Feminina de Ação Social", em 46. Em 56 e
57, manifestou apoio
ao principal rival de
Duvalier, Louis Dejoie.
Seu irmão mais velho, Gerard, era um dos
advogados de Dejoie.
Joe era figura estranha nesse ambiente.
Em 1960, a família inteira deixou o Haiti. Ficaram apenas Joe e
Mathilde, sua irmã
mais nova. "Nós não
sabemos até hoje as circunstâncias em que ele
foi preso."
Fort Dimanche
Jean Pierre só voltou ao país em
86, quando "Baby Doc" foi deposto. Naquele ano, sugeriu à federação de futebol do Haiti que o torneio nacional levasse o nome "Copa Joe Gaetjens".
"Confidenciaram-me que o governo não faria algo que lembrasse
ao povo uma pessoa que havia sido
morta em Fort Dimanche", afirma.
"Nessa época, falei com um ex-senador que tinha encontrado Joe
em Fort Dimanche, quando ambos
foram presos. Após alguns dias, ele
foi transferido de prisão, e, pouco
depois, um dos guardas falou que
ele era muito sortudo, pois no dia
anterior todos os prisioneiros de
Dimanche haviam sido mortos."
Segundo o ex-senador, o fato
ocorrera em julho de 64.
Aprovação
No ano passado, Jean Pierre, que
atualmente mora no Estado da
Georgia, nos EUA, sugeriu ao Correio Haitiano a homenagem ao ex-futebolista. O assunto foi aprovado no final do ano passado pelo
ministério que controla o correio.
Jean Pierre escreveu então uma
petição para o Senado e outra para
a Câmara dos Deputados.
Em maio, recebeu a aprovação
do Senado. Cerca de três meses
atrás, a Câmara aprovou seis imagens de Joe para figurarem como
selos oficiais do governo haitiano.
"Além do reconhecimento oficial, é a única forma de eu manter a
imagem de Joe e a desse período na
mente do povo haitiano", acredita.
Os selos começarão a ser vendidos no país até março. Três estampas serão para uso local e três para
uso internacional.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|