São Paulo, quinta-feira, 10 de outubro de 2002

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FUTEBOL

Coisa de cinema

SONINHA
COLUNISTA DA FOLHA

Um colega da faculdade de cinema, que sempre ia comigo ver jogo em estádio -não o Torero, que era contemporâneo mas não era tão chegado-, não se conformava com a falta de filmes sobre futebol no Brasil. Bom, naquela época (começo dos anos 90) faltavam filmes brasileiros sobre qualquer assunto... E ainda não existia o "Boleiros", gostoso como um papo de bar, nem alguns bons curtas que vieram depois, como "Uma História de Futebol", do Paulo Machline.
Mas, mesmo com um aumento da produção cinematográfica em geral, ainda faltam filmes sobre futebol. A produção editorial aumentou muito nos últimos anos -só nesta semana saíram dois livros, "Eterno Xodó", sobre o Neto, de Fabricio Bosio e Renato Nalesso, e "Anjo ou demônio: a polêmica trajetória de Renato Gaúcho", de Marcos Eduardo Neves. Há sites de todos os tipos (conheci o www.futebolclassico.com.br, bem legal), e o futebol invadiu até as rádios musicais de FM (adoro o "Na Geral", da Brasil 2000). Mas o cinema continua devendo.
Pensei muito nisso na semana passada por causa do Alberto, jogador do Santos. Desde a véspera de Corinthians x Santos, já se sabia que ele estava com amigdalite e que iria jogar assim. E a gente comenta isso de passagem, como se trabalhar doente fosse fácil.
Porém quase ele não entra em campo por outro motivo. A Folha de sexta contou a saga: ele se enganou quanto ao horário de saída, recebeu uma ligação dos outros jogadores que já estavam no ônibus ("E aí, você não vai?"), achou que estavam brincando, descobriu que era sério quando o telefone foi para a mão do auxiliar técnico, resolveu ir para São Paulo com o próprio carro, deu de cara com a Imigrantes fechada, subiu pela Anchieta e pegou o trânsito "normal". Chegou atrasado, é claro, e a primeira pessoa que encontrou no hotel foi -quem mais?- o técnico Leão, que não é dos mais afáveis.
Imaginem todas essas cenas em montagem paralela. Os jogadores no ônibus, apreensivos e irônicos. Alberto em casa, primeiro surpreso e depois apavorado. O Leão de testa franzida, inconformado. Os policiais se deslocando para o estádio, os torcedores saindo do trabalho, os auxiliares das TVs esticando os cabos e os vendedores de pernil fazendo molho vinagrete. Corta para o Alberto entrando no carro enquanto outros jogadores do Santos dormem, ouvem música no discman ou simplesmente olham pela janela.
Os torcedores chegam ao Pacaembu em grupo, rindo alto e preparando provocações, sem saber que ter o ingresso na mão não vai ser garantia de entrar no estádio, cujos arredores começam a ferver. Alberto, sozinho no seu carro, ouve o repórter da rádio falar sobre o Diego e tenta passar um caminhão. Os jogadores do Corinthians estão no seu ônibus, mais animado que o do Santos. Um policial enxuga o suor e tem o pressentimento de que a noite não vai ser fácil...
Seguem detalhes de reações e sentimentos. Enquanto milhares tentam adivinhar o resultado do jogo, Alberto só quer saber se vai entrar em campo -o que ele só descobre quando Leão anuncia a escalação, bem depois de recebê-lo sem dizer palavra. Alberto joga e faz aquele gol de bicicleta quando milhares de torcedores ainda estavam do lado de fora.
Só não dá um bom filme se acharem que o roteiro é irreal demais! Cinema e futebol têm tudo a ver.

Pró pontos corridos
Digamos que, na última rodada do Brasileiro, se classifique em oitavo lugar um time que nunca tenha estado entre os melhores durante o torneio. Digamos que, por milagre ou incrível coincidência de resultados, esse time fosse o Palmeiras. Ou o Paraná, o Figueirense, o Paysandu... Em um jogo, esse time desbanca o primeiro colocado com um suado 1 x 0. Em outros quatro jogos, leva o título de campeão Brasileiro de 2002. Seria emocionante, cinematográfico... mas insano!

Pró amor verdadeiro
Alguns torcedores do São Paulo ficaram indignados com o atacante Reinaldo porque ele não comemorou os gols contra o Flamengo. Eu achei legal... E ele fez os gols, não fez? Então pronto. Torcedor de futebol é cheio de melindres, parece namorada ciumenta...

E-mail
soninha.folha@uol.com.br



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