São Paulo, sábado, 11 de setembro de 2004

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FUTEBOL

Mediocridade globalizada

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Tinha tudo para ser uma quarta-feira gorda, de festa.
Em Berlim, voltavam a se enfrentar os dois finalistas da última Copa do Mundo, Alemanha e Brasil. Por aqui, o duelo era entre os dois líderes do Campeonato Brasileiro, Santos e Atlético-PR.
Mas os dois jogos decepcionaram. É difícil dizer qual dos dois foi mais monótono e sem brilho. Em ambos faltou tudo: ousadia, imaginação, alegria.
Claro que há razões concretas para a ruindade de cada uma dessas partidas, mas dois jogos tão medíocres no mesmo dia me fizeram pensar num artigo publicado há algumas semanas na "Time", assinado por Tony Karon.
Diz o articulista norte-americano que, até algumas décadas atrás, era fácil identificar a maneira de jogar de cada país. Cada seleção tinha um "idioma" próprio, intransferível.
"O jogo inglês era todo "chutão e correria", com a bola sendo alçada com a maior freqüência possível na área, onde um atacante durão abria caminho à força entre os zagueiros para enfiar sua cabeça na bola, fosse em direção ao gol, fosse para o chute de um companheiro que vinha de trás", resume Karon.
"Já os italianos", prossegue o artigo, "jogavam um futebol ambulante, tocando a bola um para o outro ao longo de quase todo o campo, escolhendo companheiros para passar com a lenta precisão de um jogo de xadrez, com o intuito de tirar um dos defensores adversários de posição e criar um espaço vazio onde se poderia desfechar um ataque rápido e um chute a gol". Os alemães, em resumo, praticariam uma combinação da força física do jogo inglês com a organização e a disciplina tática dos italianos.
E o Brasil? Responde Karon, nostálgico: "Ah, o Brasil, cuja poesia com a bola fazia todas as variedades do futebol europeu parecerem prosaicas. Eles enfatizavam aquele tipo de exibição do talento e da criatividade individual que a maioria dos sistemas de treinamento europeus tinha extirpado de seus jovens já na adolescência. Criavam uma forma vertiginosa e melódica do jogo (personificada no jovem Pelé) na qual os jogadores faziam rotineiramente o imprevisível".
Pois bem. Segundo o articulista, isso tudo é coisa do passado. Com a globalização econômica, que, no futebol, se traduz no êxodo dos melhores jogadores da América Latina, da África e da Ásia para os clubes europeus, o jogo se estandardizou, adotou um idioma universal e anódino.
Claro que o brasileiro continua sendo valorizado por sua habilidade e sua fantasia, mas essas virtudes são "enquadradas" num sistema mais pragmático, que dá ênfase à competitividade e à disciplina do jogo coletivo.
Do mesmo modo, a seleção brasileira adota esquemas e precauções originalmente "europeus". Karon lamenta que o Brasil, mesmo nos triunfos de 1994 e 2002, não dê mais a impressão de ser "um bando de sujeitos se divertindo como se estivessem jogando na praia". Depois de ver Alemanha x Brasil, lamento com ele.

Clássicos quentes
Fim de semana de clássicos em São Paulo e no Rio de Janeiro. No confronto paulista, o Palmeiras precisa desesperadamente da vitória para interromper seu declínio, e o Santos precisa voltar a convencer seu torcedor de que é o melhor time do país. No Rio, nada seria melhor para selar a recuperação rubro-negra que uma vitória no Fla-Flu, mas o tricolor vem embalado pela sua primeira vitória fora de casa.

De grão em grão
De 1 a 0 em 1 a 0, o Corinthians sobe na tabela. Mesmo sem um futebol vistoso, já está só a um ponto dos rivais Palmeiras e São Paulo. O jogo de amanhã, contra o Atlético-PR, será um bom teste para ver até onde pode ir o fôlego do time que renasceu das cinzas nas mãos de Tite.

E-mail jgcouto@uol.com.br


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