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Um oceano separa Romário de Reinaldo
JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas
Quase três meses depois da batalha campal da final do Paulista,
Corinthians e Palmeiras voltam
amanhã ao Morumbi.
Cabe esperar que toda a rivalidade entre essas duas grandes forças se resolva no terreno do simbólico, isto é, ""na bola".
Afinal, para alguma coisa deve
ter valido o fato de nossos antepassados, há muitos milhares de
anos, terem aprendido a dançar
para a lua e a fazer desenhos nas
paredes das cavernas. Desde então, a cultura -em suas infinitas
formas- tem sido o meio pelo
qual o homem educa seus instintos e afasta-se da barbárie.
E o futebol está no centro da
nossa cultura. É, ainda, o que sabemos fazer melhor (ao lado, talvez, da música) nestes tristes trópicos. A luminosa vitória de terça-feira sobre a Argentina é uma
prova suficiente disso.
Não é possível que um povo capaz de uma arte tão refinada saia
trocando sopapos e tiros por aí,
sem mais nem menos. (O pior é
que é possível, sim, mas vamos fazer de conta que não.)
Corinthians x Palmeiras tem tudo para ser um grande jogo de futebol. O Corinthians continua no
topo do topo, depois do ligeiro tropeço contra o Flamengo, e o Palmeiras, se quer passar à próxima
fase, tem de correr para recuperar
os pontos perdidos no início do
campeonato.
Os dois times conseguiram vitórias expressivas no meio da semana, ambas fora de casa, e vão entrar em campo embalados.
O gol de Zinho contra o Racing
foi uma pequena obra-prima.
Aliando rapidez, jogo coletivo e
talento individual, provou que o
alviverde, quando quer, não se
restringe aos chuveirinhos na
área inimiga.
Ao proibir o goleiro Roger de
aparecer nu numa revista, o treinador do São Paulo, Paulo César
Carpegiani, revelou uma obtusidade moral que contrasta com
suas ousadias no plano tático-futebolístico.
Num país patriarcal, machista e
autoritário até a medula, esse tipo
de atitude repressora costuma
conquistar o aplauso de boa parte
da torcida.
Ainda me lembro muito bem
das reações enfurecidas de alguns
leitores quando critiquei a Parmalat por proibir a nudez de
Oséas. Nenhum deles apresentou
argumentos convincentes -só
histeria e impropérios.
O fato é que o futebol de Vampeta e de Dinei, assim como as
vendas da Batavo, não parece ter
sofrido nenhuma queda pelo fato
de eles terem exibido seus corpos
numa revista (a mesma, aliás).
Qual é o problema, então? Desconfio que Juca Kfouri esteja com
a razão: só o dr. Freud é capaz de
explicar esse pânico diante de um
homem nu. (Já posso até ouvir
certos torcedores dizendo: ""Esse
negócio de Freud, pra mim, é coisa de viado".)
Já que estamos falando em ousadia e conservadorismo: Romário disse que, se não o tivessem
proibido de exibir mensagens políticas em suas camisetas, a próxima seria em homenagem ao cacique Antonio Carlos Magalhães. E
protestou contra a repressão a sua
liberdade de expressão. Estranha
rebeldia essa, que bajula os donos
do poder.
Lembrei do genial artilheiro
Reinaldo, do Atlético-MG, que em
plena ditadura militar declarou
que era socialista e foi tachado de
subversivo, maconheiro e (claro)
bicha. Um oceano político e moral
separa esses dois supercraques.
E-mail jgcouto@uol.com.br
José Geraldo Couto escreve às segundas-feiras e aos sábados
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