São Paulo, sábado, 11 de dezembro de 2004

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MOTOR

Vale um Oscar

FÁBIO SEIXAS
DA REPORTAGEM LOCAL

Primeiro ato: GP da Itália, três meses atrás, última prova do ano na Europa. Chance derradeira para aparecer, já que boa parte da mídia não viaja ao outro lado do mundo, principalmente com o Mundial decidido.
Montezemolo convoca os repórteres para reclamar da divisão de verbas. Ele, como os outros chefes de equipe, acha que sobra muito pouco para quem dá o espetáculo.
Ecclestone surge de surpresa, puxa uma cadeira, senta-se em meio aos jornalistas, ouve atentamente. Ao final, levanta-se, junta-se ao italiano, abraça-o. Afirma que se esforçará para melhorar a situação. Faz juras de amor.
Segundo ato: Londres, última segunda-feira. Fato raro na sua vida, Ecclestone leva uma rasteira. A Justiça inglesa dá ganho de causa aos bancos que no papel detêm 75% da F-1 mas que, na prática, nunca apitaram nada.
Esse desfecho era esperado. Surpreendente é a primeira reação do inglês. Em vez de espernear, de gritar bravatas e injúrias, mantém a calma. Diz que a decisão, para ele, não tem importância e lança uma apropriada analogia com o mercado imobiliário: os bancos teriam herdado a casa, mas não a querem e, agora, apenas estão tentando valorizá-la.
A explicação estaria no entreato, e a estrela é a GPWC. Aquela empresa formada por montadoras que, exatamente pelo problema de divisão do bolo, ameaçam lançar uma "nova F-1" ao fim do Pacto de Concórdia, o contrato que amarra os times a Ecclestone.
Imaginemos que o negócio saia do papel e que hajam duas categorias em 2008, a exemplo do que ocorre nos EUA. Qual dos dois campeonatos será a "verdadeira F-1"? O que tiver a Ferrari, é claro.
Sim, Ecclestone é maquiavélico. O bastante para deixar o mico nas mãos dos bancos e se bandear com Ferrari (Fiat), McLaren (Mercedes), Williams (BMW) e Renault para a GPWC. Usando a analogia anterior, o inquilino colocaria fogo na casa antes de devolvê-la para o proprietário.
Ecclestone já cortejou a Ferrari publicamente. Nos bastidores, certamente flerta com as demais.
E por que interessaria às montadoras uma associação com o homem de quem tentam fugir agora? Porque Ecclestone sabe o caminho das pedras. Foi ele que transformou a F-1 quase amadora do início dos 80 no espetáculo ultraprofissional de agora. É ele, e não os chefes de equipe, que negocia com cada promotor de GP, que luta por centavos com emissoras de TV, que há anos enfrenta o lobby anticigarro na Europa.
Para as montadoras, um Ecclestone devidamente enquadrado seria ideal. A chance que surge agora é perfeita. Talvez única. E ele, embora embolsando menos do que agora, sairia da confusão de cabeça erguida, ainda como o grande chefe. Sairia vitorioso.
Há uma outra possibilidade. De que tudo isso, dos abraços em Montezemolo ao desdém pela derrota na Alta Corte, seja, de fato, um grande blefe. Os bancos acreditariam estar numa enrascada e correriam para se livrar das ações. Ecclestone, aqui, também seria o grande vitorioso.
Deve ser por isso que ele se dá tão bem com Schumacher.

Melhor ator
Ecclestone encenou excluir Silverstone do calendário, Stewart tirou dinheiro não se sabe de onde e garantiu o GP. O Mundial terá mesmo 19 etapas. Será que a F-1 de hoje preenche tudo isso?

Melhor roteiro
Danica Patrick, 22, vai correr a IRL em 2005 pela Rahal. Nesse caso, nenhuma encenação, nenhuma jogada de marketing: terceira na F-Atlantic, ela ganhou a vaga no braço. E ainda é bonita.

Melhor ator coadjuvante
De Webber, na "Autosport": "O Michael chega para conversar e quando você percebe ele já te fez 20 perguntas. Esse é um dos segredos dele".

E-mail fseixas@folhasp.com.br


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