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FUTEBOL
João Sem Medo
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Neste mês , a morte do jornalista João Saldanha, técnico da seleção brasileira nas eliminatórias de 70, completa dez
anos. A TV Cultura reprisou, no
programa "Roda Viva", uma entrevista feita com Saldanha em
1987. Assisti pela primeira vez.
Desfrutei novamente da inteligência, dignidade e também dos
devaneios e fantasias do técnico.
João Sem Medo foi um visionário.
Gostava de divagar, filosofar e
conversar sobre coisas úteis e inúteis. Nem tudo o que dizia era verídico, mas estava próximo.
Todos nós, uns mais, outros menos, misturamos a realidade com
a ficção.
Se não fosse assim, a vida seria
muito chata.
Saldanha falou sobre tudo: viradas de mesa, péssimo calendário, maracutaias no futebol, preconceitos como o homossexualismo no esporte, cabeças de área
que só sabem fazer faltas, e que foi
substituído do cargo de treinador
pela ditadura.
Não tenho dúvidas disso.
Os problemas continuam os
mesmos. Até o do cabeça-de-área.
Na entrevista, há 13 anos, João
afirmara que o grande problema
da seleção era que os adversários
marcavam os avanços dos laterais brasileiros e os cabeças-de-área, que existiam para fazer a
cobertura dos laterais, ficavam
sem função. Treze anos de mesmice. Pior, quando tentam cobrir
os laterais, chegam atrasados, já
que têm de correr lateralmente.
Logo que Saldanha assumiu a
seleção, me chamou e foi logo na
bucha: "Qual o problema?". Respondi: "Não quero ser o eterno reserva do Pelé". Evidentemente,
não queria usurpar a coroa do
Rei e sim atuar ao lado dele.
João disse: "A partir de hoje, você é o titular absoluto. Pode atuar
mal, que não sai do time".
Ele não sabia o risco que corria.
Foi o meu melhor momento na
seleção.
Luxemburgo deveria fazer o
mesmo com o França. Até o jogador provar que não merece tanto.
Ele não é extraordinário, mas é
um excelente jogador. Depois de
dois anos de sucesso, não se pode
mudar o conceito sobre o França
porque ele atuou mal nos últimos
jogos.
Recentemente, muitas coisas
endoidaram a cabeça do jogador,
inclusive a implicância do Levir
Culpi. Logo, voltará a brilhar.
Sem a presença do Ronaldo, da
Inter, e do Romário, França é o
melhor.
Corre-se o risco de ele se sentir o
dono do pedaço e não lutar para
manter a posição. Não acredito.
Muito pior é trocar os atacantes
em todos os jogos.
Aliás, neste momento ruim da
seleção, pedem cada jogadorzinho... Muitos servem para os clubes, mas não para o time brasileiro. A seleção não está lá essas coisas, mas não vamos mediocrizá-la ainda mais.
Cuidado, Luxemburgo! Não desespere.
O excelente ataque do São Paulo, que fez gols por mais de 30 partidas seguidas, foi anulado pelo
Cruzeiro nos dois jogos finais.
No segundo, até o primeiro gol
do São Paulo, as duas ótimas
oportunidades foram do Cruzeiro, que mereceu o título.
Levir Culpi errou ao colocar o
Axel nos momentos finais do jogo, depois de uma longa ausência.
Além disso, Fabiano não é nada
excepcional, mas é muito superior
a Maldonado.
Marco Aurélio não se preocupou com o árbitro, com a elegância no túnel, com sua despedida,
nem se iludiu de que o Cruzeiro,
em casa, deveria pressionar o São
Paulo desde o início.
Preocupou-se apenas com os
detalhes essenciais.
Se o Cruzeiro não tivesse privilegiado a marcação e o contra-ataque em quase toda a Copa do
Brasil, dificilmente ganharia o título. Foi a vitória da humildade.
A presença do Muller, no momento certo (ele entrou no jogo
antes de o São Paulo fazer seu
gol), foi decisiva.
Não é comum, mas às vezes técnico ganha jogo, como também
perde.
Marco Aurélio disse numa entrevista ao jornalista Antônio
Melane, publicada ontem no jornal "Estado de Minas", que somente soube que sairia na sexta-feira, ao contrário do que disseram os diretores do Cruzeiro.
O técnico disse que sabia que
havia interesse do Cruzeiro em
contratar o Felipão, mas nada
oficial. Certamente, deduziu que,
se fosse bem, seria mantido no
cargo.
Não sei quem fala a verdade.
Luiz Felipe é um excelente técnico, mas o salário que vai receber é assustador.
Nas últimas décadas, a supervalorização dos treinadores (não
só financeira) foi uma das causas
da piora na qualidade técnica do
futebol brasileiro.
São os jogadores que fazem a
diferença.
"Eu te invento, ó realidade!"
(Clarice Lispector)
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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