São Paulo, terça-feira, 12 de setembro de 2000

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CONTARDO CALLIGARIS
Bugiganga para atletas e jornalistas

Em Sydney, os membros da imprensa recebem uma mochila de náilon da Foster's -cerveja oficial dos Jogos. Ela contém vários objetos. Um convite para a festa oficial da imprensa -os anfitriões são o "Daily Telegraph" e a Visy (companhia de empacotamento e reciclagem), com a ajuda da Foster's, do vinho Lindemans e da Coca-Cola. Uma caneca Robert Timms" -o café da Olimpíada. Uma cartucheira do cartão Visa com bolso para garrafa, preenchido por uma Coca. Um chapéu e uma esferográfica de plástico da Swatch, cronometrista oficial de Sydney-2000.
Um fio de conexão à linha telefônica para computador e um ridículo pára-sol para tela de laptop, tudo da IBM. Um bloco de anotações do McDonald's com direito a um Big Mac de graça.
Propagandas da Ansett (linhas aéreas oficiais da Olimpíada) e AMP (serviços financeiros), mais um ingresso de cinema e 20 raspadinhas pelas quais você pode ganhar até um dia na companhia de um jornalista.
Quis saber o que era oferecido aos atletas. Bolsa de esporte Technogym. Bolsa para sapatos da Unilever com desodorante, óleo de massagem e hidratante. Fones de ouvido Panasonic. Pasta de dentes e escova Colgate. Protetor solar Hamilton. Visita ao zoológico, McDonald's e cortes de cabelo da Just Cuts. Chaveiro da UPS com cartão de desconto. Cartão-postal multicultural. Camiseta Acme (roupas esportivas) e pacote da Jurlique (perfumes).
Considero este conjunto de ninharias enquanto leio o dossiê sobre o marketing da Olimpíada produzido pelo Comitê Olímpico Internacional. Entre os direitos de transmissão e os patrocínios, de 1997 a 2000, o Movimento Olímpico levantou US$ 2,5 bilhões. O descompasso é o mesmo de todos os dias -entre uma enorme potência produtiva e organizativa, às vezes cheia de nobres ambições, e um resultado decepcionante: a chuva fina do bricabraque do consumo.
A essa desproporção entre potência econômica e miséria ordinária, a Olimpíada acrescenta o esforço fantástico dos atletas, a admiração de bilhões de espectadores e a corrida das empresas para capitalizar as significações nobres do evento -para serem ditas "olímpicas". São todos os ingredientes -glórias e vergonhas- da modernidade.
P.S.: Cada atleta recebeu também 51 preservativos. Considerando o tempo médio de permanência na Vila Olímpica, a previsão de uso seria de três por dia (muito mais se os atletas se relacionarem entre si -cada um dispondo da mesma reserva). Afinal, atleta é atleta. Agora, o vexame é que não houve nenhum preservativo previsto para a imprensa.
E-mail ccalligari@uol.com.br


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