São Paulo, sábado, 14 de fevereiro de 2004

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MOTOR

Sobre anos terminados em 4

JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE

A velha máxima de que pré-temporada não vale muita coisa é tão real quanto aquela outra que diz que, às vezes, alguma coisa sai dela. Vivemos neste ano o segundo caso. O que os ensaios dizem por enquanto não é exatamente quem andará na frente, mas de que forma andará.
Duas temporadas consecutivas de alterações radicais nas regras proporcionam surpresas, inovações e também muita porrada.
Em busca do equilíbrio, a F-1 desequilibrou seus projetos.
A começar pelas asas, que perderam o carnaval de lâminas que vigorou até o ano passado. A partir de agora, serão duas, deixando os técnicos com poucas opções de regulagem e os pilotos com traseiras cada vez mais soltas. É exatamente por isso que tanta gente está rodando tão fácil por aí.
Menos lâminas significam menos downforce, objetivo declarado do novo regulamento. A FIA persegue de forma canina um modo de diminuir a velocidade nas curvas -para a entidade, a razão de poucas ultrapassagens. O problema é que, mesmo com um conjunto mais instável, os mesmos pilotos tendem, pela própria natureza, a não tirar o pé. O resultado é um monte de gente na brita e as devidas conseqüências.
Fosse só isso, estaria bom. A inconseqüência vai bem mais longe. Gary Anderson, hoje executivo da Jordan, mas um projetista que nunca foi dado a aventuras, alerta para o que classifica como uma volta ao turbulento ano de 1994. "Parece que esqueceram o que aconteceu", diz, fatalista.
Sua preocupação é a tendência verificada nos últimos anos, aguda neste momento, segundo ele, de as escuderias confiarem no uso indiscriminado do lastro.
Com um regulamento cada vez mais severo e materiais novos, os carros estão ficando, em igual proporção, cada vez mais leves. Evidente, para os projetistas é interessante obter o peso mínimo usando lastros distribuídos conforme suas necessidades pelo carro. Um conjunto rígido só se resolve construindo um novo chassi, o que é caro, ainda mais em tempos de crise e orçamentos baixos.
De acordo com Anderson, o grid atual é composto em sua maioria por carros que passam raspando pelo crash-test da FIA. No lugar de impor projetos mais seguros, a verificação só estaria delineando os limites. Mais uma vez, no lugar de enrijecer o chassi, o teste estaria transformando o resto do carro em uma casca de ovo.
Claro, deve existir um componente de nostalgia no discurso de um sujeito antigo como Anderson, semelhante ao que temos toda vez em que ralamos nossos modernos pára-choques de plástico -que não têm conserto e misteriosamente custam fortunas.
É inegável, porém, que há mais similaridades entre 1994 e 2004 do que a simples coincidência numérica. A saber, profunda mudança no regulamento técnico (agora aerodinâmica e motor, antes o fim da eletrônica), alteração no esportivo de efeito ainda ignorado (treino, reabastecimento) e um velho favorito acossado por petulantes novos favoritos.
Anderson lembra, nós lembramos muito bem. Coisas assim não dão certo. A conferir.

Mundial de Rali
O francês Sebastian Loeb se tornou, no fim de semana, o primeiro piloto de fora da Escandinávia a vencer na neve da Suécia. Para quem está acostumado a viver o verão de ano inteiro da F-1, é algo notável acompanhar uma categoria onde até o piso significa desafio para a pilotagem. Temos uma ou outra corrida com chuva e olhe lá.

MotoGP
Valentino Rossi, pelo menos por enquanto, faz história a bordo de sua Yamaha. Se correr como vem fazendo na pré-temporada, deixará constrangida muita gente que sempre se escudou nas limitações do equipamento. Do jeito que vai, daqui a pouco chegará às quatro rodas. E com chance de redimir um país que brilha mais pelo seu time vermelho do que pelos bons, apenas bons pilotos que produz.

E-mail mariante@uol.com.br


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