São Paulo, quarta-feira, 14 de abril de 2004

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FUTEBOL

A fantasia dos craques

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

Sem comparar, é impossível não lembrar do Garrincha ao ver o Felipe parar a bola na ponta direita, imobilizar os marcadores por alguns segundos, driblá-los com a sua ginga de corpo e espetacular arrancada e dar um passe preciso para o companheiro. Felipe é a prova de que Garrincha brilharia hoje da mesma forma.
Felipe contraria a regra número 1 do futebol atual, a de que todos precisam marcar e ter uma função definida. O irrequieto e romântico Abel Braga (a segunda característica é uma virtude do treinador) deixa o jogador livre, sem função, para atuar do jeito que gosta e que fazia nas peladas de infância. Após atuar de lateral, ala, volante e meia esquerda, Felipe encontrou, ou melhor, reencontrou o seu lugar.
Seria possível a seleção brasileira, com tantos craques, ter no time titular um jogador como Felipe, atuando do jeito que faz no Flamengo? Penso que não, mas ele seria uma boa opção em certos momentos, para "bagunçar" a partida. Denílson, que não tem o mesmo talento do Felipe, fez isso com sucesso em muitos jogos.
Quando imagino o Robinho na seleção, não é para ele ser um jogador tático, como o Zé Roberto, nem para jogar livre, sem função, como Felipe. Num esquema diferente do atual, Robinho marcaria pela esquerda e avançaria como um atacante. Talvez Felipe pudesse fazer o mesmo. Parreira não vai experimentar nenhum dos dois. Poderia dar certo.
No esquema atual da seleção, Robinho ou Felipe não poderiam fazer a função de volante do Zé Roberto, e sim ser reserva do Ronaldinho Gaúcho ou do Kaká. Mas, nessa posição, Alex é, merecidamente, o primeiro da fila.
A seleção já possui também um jogador extremamente habilidoso, imprevisível e irreverente, que é o Ronaldinho Gaúcho. Quando o Maradona fala, com razão, que ele é seu sucessor, quer dizer que já existe no futebol atual um fenômeno que une fantasia e espetáculo com técnica e eficiência.
Felipe e Robinho são excelentes, porém, nem chegam perto do Ronaldinho Gaúcho, Maradona e Garrincha. Além de não terem o talento desses três gênios, Robinho não possui a força muscular do Ronaldinho Gaúcho e do Maradona, e Felipe não tem a simplicidade e a ternura do Garrincha.
É muito bom ver dribladores brilhando no futebol atual. Numa longa e recente época, os técnicos, fascinados pelo cientificismo e pela prancheta, tentaram transformar o futebol num jogo somente de marcação, tático, técnico e de jogadas ensaiadas. Queriam acabar com a fantasia. O futebol ficou feio, chato e ineficiente.
Isso está mudando. Existe uma preocupação de muitos técnicos, como Abel Braga, em unir espetáculo e resultado. Ainda bem.

Venceram os melhores
Nas decisões dos Estaduais, venceram as equipes que têm os melhores jogadores. Em São Paulo, foi nítida a diferença técnica entre o São Caetano e o Paulista. Parece que o Paulista já se contentou com o vice-campeonato. Foi uma bela campanha. O São Caetano é quase campeão. Mas ainda não esqueci da zebra.
Em Minas, Alex, Jussiê e Sandro foram os destaques da vitória do Cruzeiro. Jussiê mostrou novamente que poderá se tornar um grande atacante. Ainda não é. O Atlético foi muito mal na marcação, a sua principal virtude.
No Rio, o Vasco não atacou nem marcou bem. Individualmente, o time é fraco. Felipe deu outro show. Virou rotina. Se o Fla jogasse com o Felipe (ele não mudou de posição) e mais um ou dois atacantes, seria irrelevante. Ganharia de qualquer jeito.
O mais importante não é o desenho tático, e sim o Felipe e mais alguns bons jogadores, como o jovem Ibson, o veterano Zinho e o excepcional goleiro Julio César.

Convocação
Houve surpresas, como Mancini, Dedê, Bordon e Edu, que devem estar na Copa América, já que muitos titulares estarão ausentes. Todos os novos chamados estão bem nos clubes. Edmilson deve atuar no lugar do Gilberto Silva. Fica mais evidente que a ausência do Emerson (ex-preferido) nas duas últimas convocações é uma punição ao atleta que não tinha condições para atuar na seleção e jogou pela Roma.
Da mesma forma, os jovens que atuaram no Pré-Olímpico continuam sendo tratados como fracassados e indisciplinados, por causa das brincadeiras ocorridas na concentração e que foram bastante criticadas pela comissão técnica da seleção principal.

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