São Paulo, sábado, 14 de maio de 2011

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Mais velho time, Sheffield leiloa o 1º livro de regras

FUTEBOL
Normas serviram como base para fundar a federação inglesa


RICARDO SANGIOVANNI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE SHEFFIELD

Todo torcedor agradece a Deus (ou ao ente sobrenatural de sua preferência) quando seu time marca um gol de falta. Ou quando aquele lateral arremessado no desespero para dentro da área acha a cabeça de um zagueirão e a bola morre no fundo da rede.
Ninguém se lembra, porém, de agradecer ao Sheffield FC, da Inglaterra, o time de futebol mais antigo do mundo. E por que deveria?
Porque faltas e laterais são regras que só existem porque foram inventadas pelo clube, há 153 anos, e fazem parte do primeiro conjunto de normas escritas do esporte.
A relíquia ainda existe e vai a leilão no dia 14 de julho, em Londres. O clube espera arrecadar entre 800 mil e 1,2 milhão de libras com a venda de um pacote de documentos históricos que inclui o primeiro rascunho manuscrito das regras do esporte, de 1858, e a única cópia remanescente do primeiro libreto de normas impresso, de 1859.
Antes das 11 regras do livrinho, o futebol era literalmente uma batalha campal.
Além da regulamentação de empurrões, agarrões e rasteiras como faltas que dão direito a tiro livre, o manual contém regrinhas que hoje qualquer criança conhece, como a proibição de conduzir a bola com as mãos e de sair com ela do gramado, além da saída do jogo a partir do centro do campo.
Parece banal, mas foi essencial para pôr ordem no esporte, antes praticado de maneira selvagem e sem um conjunto de regras unificado.
As normas inventadas pelo Sheffield FC foram adotadas por universidades e escolas inglesas, nas décadas seguintes. E em 1863 serviram de base para fundar a Federação Inglesa de Futebol.

VENCER PARA QUÊ?
Mas o fato de ter praticamente inventado o futebol não faz do Sheffield FC um exemplo de como se praticar o esporte -ao menos não dentro das quatro linhas.
O time atualmente figura numa liga amadora equivalente à oitava divisão do futebol inglês, em que disputa jogos de qualidade duvidosa -neste ano, terminou num suado 11º lugar. O maior título de sua história foi a Copa Amadora Inglesa, ancestral da atual Copa da Inglaterra. Mas isso lá em 1904.
Depois, não ganhou nada. Além de faltas e laterais, suas maiores façanhas no esporte são "o primeiro escanteio", "a primeira cabeçada", "o primeiro jogo com iluminação artificial" e "o primeiro a usar traves sólidas".
Pouco? Não para a Fifa, que deu ao clube sua honraria máxima, a Ordem do Mérito, concedida em 2004 ao Sheffield FC, por ser o mais antigo, e ao Real Madrid, por ser o mais bem-sucedido clube na história.
"O mais bem-sucedido pode mudar. O mais rico também. Mas o título de mais velho sempre será nosso", vangloria-se Richard Tims, presidente do time há sete anos.
Na sala de troféus, exibe cerca de 30 condecorações, quase todas em homenagem à "antiguidade" do clube.
"Ganhar é bom", diz Tims, mas está longe de ser o principal objetivo do clube -ele próprio confessa torcer pelo Sheffield Wednesday, um dos dois outros times dali.
Em sua gestão, tem se dedicado a jogos beneficentes e ações humanitárias, como a distribuição de chuteiras a crianças na África do Sul, no ano passado. O clube também mantém três equipes de pessoas com deficiência física, seis equipes femininas, um time de futsal e treinadores em 45 escolas primárias.

EXPANSÃO
Parte do dinheiro arrecadado com o leilão, segundo Tims, será usada para melhorar a infraestrutura do clube.
Atualmente, o Sheffield FC manda seus jogos num estádio amador a meia hora do centro, ladeado por uma modesta estrutura de madeira onde funcionam a sala de reuniões da diretoria e dois vestiários apertados.
Outra parte do dinheiro vai para ações de marketing.
"Atualmente, temos de 200 a 500 torcedores. Mas, sendo o time mais antigo do mundo, temos mais de 1 bilhão de fãs em potencial. Já demos ao futebol as faltas, os laterais, os escanteios. Agora precisamos de apoio para sobreviver por outros 150 anos", afirma Tims.
Aos 47 anos, o mandatário diz que não ficou rico, mas que já conheceu o mundo viajando para congressos e jogos comemorativos. Conta com orgulho que já divulgou o clube a astros como Beckenbauer, Bob Charlton, Pelé e Carlos Alberto Torres.
O neto deste último, Diego, que vive na Inglaterra, é embaixador do Sheffield FC no Brasil. No entanto, os planos de arrebanhar novos fãs, embora ambiciosos, ainda estão longe da realidade: na sede do clube, a reportagem tentou comprar uma camisa oficial do Sheffield FC, mas o produto estava esgotado.


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