São Paulo, domingo, 14 de julho de 2002

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Fora de grandes torneios há 90 dias, times apelam para escambo e papagaio

Parados, clubes voltam no tempo

FÁBIO SOARES
DA REPORTAGEM LOCAL

Criado há pouco mais de um ano sob os rótulos de moralizador e moderno, o calendário quadrienal do futebol brasileiro até agora só ajudou a levar clubes tradicionais do país de volta ao passado.
Os efeitos da inovação, aliados à Copa do Mundo, originaram a maior lacuna da história recente de times como Santos, Botafogo-RJ, Lusa, Guarani e Ponte Preta, que completam hoje três meses longe de competições relevantes.
Os cinco entraram em campo pela última vez no dia 14 de abril, na rodada final da fase classificatória do Torneio Rio-SP, e só devem voltar a atuar em 10 de agosto, no início do Nacional-2002.
O tricampeão brasileiro Internacional-RS vive situação semelhante, atenuada apenas pela rápida participação no Supercampeonato Gaúcho, encerrado dia 2 de junho, mas que, segundo a própria direção do clube, "não mudou em nada a situação". O time gaúcho não conseguiu na Sul-Minas vaga na Copa dos Campeões.
A longa inatividade trouxe de volta ao cotidiano desses clubes medidas que remontam um futebol antigo, ou seja, pobre. Na contramão de um esporte que movimenta cada vez mais dinheiro mundo afora, voltaram à moda entre os cartolas termos como escambo (troca de mercadorias) e papagaio (empréstimo).
"O Inter vem se virando na base do escambo. É jogador por jogador e muita negociação com os fornecedores", lamentou Newton Drummond, gerente de futebol da equipe gaúcha. O clube apelou também aos tradicionais sorteios, que devem começar a partir da primeira quinzena de agosto.
O Inter também atribui ao hiato do calendário o aumento da inadimplência dos sócios. "Se não tem jogo, eles somem e param de pagar", ressaltou Drummond.
O Guarani está trocando espaço em placas publicitárias por galões de água e alimentos. "Temos uma série de compromissos atrasados. Estamos recorrendo a papagaios e fazendo de tudo para vender jogadores", admitiu o vice-presidente, Antonio Carlos Cecacci.
O clube campineiro e o porto-alegrense se ajudam com amistosos. O Guarani recebeu o Inter ontem no estádio Brinco de Ouro, perdeu por 3 a 0, e o jogo de volta acontece no Beira-Rio. Cada um fica com a renda em seu campo e banca a hospedagem do visitante.
No Santos, a receita geral encolheu de R$ 14,6 milhões no primeiro semestre de 2000 para R$ 8,2 milhões neste ano. No mesmo período, a folha de pagamento mensal despencou de R$ 3 milhões para R$ 280 mil, segundo o presidente Marcelo Teixeira.
O orçamento do Botafogo com o elenco, antes de R$ 1,4 milhão, foi reduzido a R$ 600 mil pelo presidente Mauro Ney Palmeiro.
"Só em 1955 o Botafogo passou tanto tempo sem jogar porque ficamos fora do terceiro turno do Carioca", recordou Palmeiro, sem considerar as partidas do Estadual passado realizadas no decorrer da Copa na Ásia.
Por falta de recursos para as passagens aéreas, o Botafogo desistiu de excursionar pela Europa, onde enfrentaria, entre outros, Paris Saint-Germain e Sporting.
Mesmo os clubes do Rio em atividade na Copa dos Campeões enfrentam momentos periclitantes. O Flamengo depôs seu presidente na terça passada, os atletas do Fluminense fizeram greve por atraso de salários anteontem, e o Vasco pena na tentativa de fechar um contrato de fornecimento de material esportivo com a Umbro.
Outra lembrança que é resultado das férias ditadas pelo calendário são as camisas sem patrocínio. Santos, Guarani e Lusa ainda esperam boas ofertas pelo espaço nos uniformes, algo cada vez mais difícil devido à falta de exposição.
As glórias de outrora, por outro lado, ajudaram o Santos a acertar quatro amistosos no exterior, o mais importante deles contra o Glasgow Rangers, em Nova York.
Os clubes culpam os mentores do calendário, elaborado claramente para atender interesses de emissora de TV e cartolas. Mas nesse ponto, o presidente do Santos faz o mea culpa. "Se eles mandam, é também por incompetência dos dirigentes dos clubes."


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