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FUTEBOL
A descoberta do futebol
MÁRIO MAGALHÃES
COLUNISTA DA FOLHA
Conheço uma guria chamada Ana que anda encantada
com o futebol. Na goleada do
quarteto sobre o Chile, ouviu da
irmã adolescente: "Ué, o Ronaldinho Gaúcho não tá jogando?".
A Ana elucidou: "Claro que
não. Levou mais um cartão amarelo. Tá suspenso". Ela tem quatro anos de idade.
O mundo para a Ana se divide
entre os que vão para a Copa e os
que não vão. Dia desses, turbinou
seu jogo da memória de países.
Com o jornal aberto, checava se a
nação estampada na carta vai à
Alemanha. Em caso positivo, somava mais um ponto. A mãe ajuda, que a Ana tropeça nas letras.
Encasquetou, certa noite: "Atlético não começa com "a'?" O pai
confirmou. "E por que, na televisão, tem um "c" antes do "a'?" Descobriu o Clube Atlético Mineiro.
A Ana tem olho para tudo. Procura a foto do Kaká e fala que o
garoto é bonito. Tudo bem, não
faz mais que repetir a Maria, a irmã de 15 anos.
Mas na transmissão de Bétis e
Barcelona apareceu o Rijkaard
em close, e a Ana indagou: "É o
técnico do Barcelona?". Ela já entendeu que técnico é mais ou menos como o professor na escola.
Então, suspirou: "Como ele é lindo. Não é, pai?".
Ao ver o retrato do tal Ramirez,
contou: "Ei, o El Tigre pintou o
cabelo de roxo". Será verdade?
Antes do segundo jogo do paraguaio pela nova equipe, cantou
músicas que criou em homenagem ao atacante. Logo o cara se
contundiu, e a Ana murchou.
Sabe-se lá por que, torce pelo
Flamengo. Deve ser coisa da mãe
e da irmã. Diz que é também Brasil e Ceará. Impressionada com o
apitador gatuno, a cada falta implora: "Expulsa! Expulsa!". Se não
sai o vermelho, grita: "Juiz ladrão, juiz do mensalão!"
Imagino que não tenha idéia do
que se trata. Apropriou-se dos
versinhos lançados pelo pai de
um amiguinho tricolor. Preocupa-se: "Será que o juiz vai nos prejudicar de novo?". O verbo é esse,
prejudicar, e ignora-se onde o conheceu.
Adora uma polêmica. Pulando
sobre a cama, proclamou: "Não
foi falta, não foi falta!". No lance,
um jogador do Grêmio e um do
Avaí foram expulsos. Ficou feliz
quando o avô ligou para dizer a
mesma coisa.
A Ana acorda cedo e corre para
ver os resultados no jornal. É que
ela adormece antes do fim das
partidas noturnas. Quer saber por
que tantos jogadores raspam o
cabelo. Acha o Parreira parecido
com o Abel.
Está chateada com o Diego, porque o goleiro rubro-negro "deixa
passar todas as bolas". Pergunta
se o Zico vai jogar domingo contra o São Paulo. Quando o Flamengo perde mais uma, consola:
"Não fica triste, que o importante
é que o Brasil já tá na Copa".
Anteontem, esqueceu por um
instante a seleção: "Quando não
existe nenhuma pessoa, como é
que nasce a primeira pessoa?".
O pai ficou de pensar. Ele se enternece com as descobertas da
Ana e desconfia que, a despeito
das bandalheiras de muita gente,
ninguém vai acabar com a paixão pelo futebol.
O melhor
Com dois passes espetaculares,
Ronaldinho presenteou os atacantes nos dois primeiros gols.
No terceiro, sofreu a falta. O
que se quer mais dele?
Crime
Será que ninguém vai ser punido pela barbárie no treino em
Belém, com tantos feridos?
Em tempo
Como corrige o vascaíno André, não consta da Constituição
o princípio de que o ônus da
prova é da acusação. É o Código de Processo Civil que prevê
(art. 333) que "o ônus da prova
incumbe ao autor (...)." O Código de Processo Penal estipula
(art. 156) que "a prova da alegação incumbirá a quem a fizer".
O STJD não provou manipulação em vários jogos anulados.
E-mail: mario.magalhaes@uol.com.br
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