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FUTEBOL
Por falar em preto-e-branco
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Duas graves acusações de
racismo ganharam espaço
na imprensa e na televisão nos últimos dias.
Uma delas envolve um condomínio de luxo do Rio de Janeiro,
que teria discriminado a mãe e
uma tia do craque Ronaldo. Por
extrema ironia, o mesmo condomínio abriga, sem que ninguém
proteste, apartamentos de criminosos de colarinho branco.
O fato é ilustrativo.
O atleta mais bem-sucedido da
atualidade, eleito três vezes o melhor futebolista do planeta, é levado, de repente, a despertar de seu
sonho de Cinderela e confrontar o
ranço senhorial e escravista de
nossas elites.
O processo de embranquecimento simbólico vivido por Ronaldo não se estendeu nem mesmo a seus parentes mais próximos. A passagem pela qual se chega à plena cidadania ainda é
muito estreita. Para a maioria
dos pobres e negros (dos mais variados matizes), é mais difícil passar por ela que um camelo passar
pelo buraco de uma agulha.
A tentativa de exclusão das familiares de Ronaldo é análoga ao
horror com que certas colunistas
sociais vêem a pobretona Marisa
da Silva ter acesso aos palácios do
poder e aos requintes franqueados por sua nova condição de primeira-dama do país.
Quer dizer: o Lula passa, mas a
Marisa não. O Ronaldo passa,
mas sua parentalha não.
Diante de uma brutalidade como essa, Ronaldo não deve vacilar. Tem mesmo que pôr a boca
no mundo, denunciar e processar.
Nunca é demais lembrar que racismo é crime, ainda que seja o
crime mais impune que se pratica
no país.
É à luz desse quadro geral que
se deve ver a outra acusação de
racismo surgida na última semana. Ela é aparentemente mais leve -mas só aparentemente. O
craque Diego, do Santos, teria
chamado os corintianos Kléber e
Renato de macacos durante jogos
entre os dois times.
Esse tipo de incidente não é novo. O colombiano Rincón acusou
um rival de ter proferido o mesmo
tipo de ofensa, alguns anos atrás.
Há quem atribua a grita atual
dos corintianos a uma tentativa
de "conturbar o ambiente" e desestabilizar o jovem time santista
às vésperas do segundo e decisivo
jogo da final do Brasileiro.
Sinceramente, não acredito em
armação. Vi na TV quando Renato, quase a contragosto, admitiu envergonhado ter recebido a
ofensa. E não acho que Kléber,
atleta consciente e de idéias firmes, iria levantar a questão de
modo leviano.
Há também quem minimize a
importância do fato lembrando a
juventude de Diego. "É só um garoto. Nessa idade, a gente fala
muita bobagem."
Mas é nessa idade, também, ou
até antes, que se formam os valores que carregamos pela vida inteira. Se Diego xingou seus adversários de macacos, como acredito
que xingou, deve ser punido por
isso.
Já que é menor de idade e não
pode ser responsabilizado criminalmente, que receba um puxão
de orelhas (metafórico, claro)
-dos pais, do clube, da opinião
pública.
Podem dizer que estou exagerando, mas com racismo não se
transige. Passar condescendentemente a mão na cabeça de um jovem preconceituoso (ou leviano, o
que dá quase no mesmo) é o caminho mais curto para produzir
um adulto que vai querer obrigar
os negros a usarem o elevador de
serviço.
Opção desesperada
Se o Corinthians pretende explorar a jogada aérea contra o
Santos amanhã, trata-se de
uma opção muito discutível.
Primeiro, porque o time não
treinou esse esquema ao longo do ano. Segundo, porque
os zagueiros santistas são altos e se posicionam bem. Terceiro, porque seria um retrocesso em relação ao esquema
de jogo da equipe -a não ser
que a jogada seja apenas
"mais uma opção". O que
tem faltado ao Corinthians,
além de atenção na defesa, é
criatividade para fugir da
mesmice. E também um certo elã, o impulso vital que faz
os garotos do Santos se multiplicarem em campo.
Faltam 90 minutos
O maior risco que o Santos
corre é o de entrar de salto alto, já se julgando campeão. O
Corinthians não vem bem,
mas cansei de vê-lo ressurgir
das cinzas quando menos se
esperava.
E-mail jgcouto@uol.com.br
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