UOL


São Paulo, sábado, 15 de março de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

FUTEBOL

A política do inchaço

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

Se a Conmebol, entidade que dirige o futebol na América do Sul, ceder à pressão da CBF e aceitar mais quatro clubes brasileiros na Copa Sul-Americana, estará consagrada mais uma vez a política do inchaço, que também poderia ser chamada de política da acomodação, do conchavo ou da covardia.
Que política é essa? É a mesma que a antiga CBD (antecessora da CBF) realizava no Campeonato Brasileiro nos tempos do regime militar. Os mais velhos se lembram do slogan: "Onde a Arena [o partido governista" vai mal, mais um time no Nacional".
Quando João Havelange foi alçado da CBD para a Fifa, levou ao âmbito mundial a política do inchaço. Novas vagas foram criadas na Copa do Mundo e nas eliminatórias, sobretudo para países da África e da Ásia, de modo a ampliar a base de apoio de Havelange e seus comparsas.
Aliás, o sucessor "feito" pelo velho cartola, Joseph Blatter, parece inclinado a levar adiante a lição do padrinho. Já se fala em ampliar o número de seleções (de 32 para 36) no próximo Mundial.
No Brasil, quase sempre que há alguma pendenga por conta de viradas de mesa, de disputas judiciais ou de regulamentos pouco claros, acaba-se por contemplar todos os descontentes, simplesmente aumentando o número de clubes participantes da competição em questão.
Trata-se de uma solução fácil, mas mentirosa e nociva ao esporte e ao entendimento do que seja democracia.
A prática da democracia não consiste em agradar a todos -ou a todos os que esperneiam-, mas em garantir que a lei seja cumprida e que todos tenham seus direitos respeitados. Só isso.
Mas a política do inchaço não está restrita ao futebol, nem nasceu dentro dele. A meu ver, ela tem a ver com a tendência ao conchavo e à acomodação que sempre marcou nossa história, desde o período colonial.
"Transição pelo alto", "acordos entre as elites", "mudanças sem ruptura", "modernização conservadora" -várias foram as expressões utilizadas para dar conta desse fenômeno, que é uma espécie de "lado B" do mito da índole pacífica do povo brasileiro.
"Fazer a revolução antes que o povo a faça", "mudar tudo para que tudo continue como está" são outras frases que nos soam familiares. Quando um novo governo, para contemplar os partidos da coalizão que o apóia, cria novos cargos a torto e a direito, não está fazendo mais do que a "política do inchaço".
Pretender agradar a todos ao mesmo tempo -bancos e indústria, campo e cidade, patrões e empregados- pode ser uma forma extrema da "política do inchaço". A longo prazo, alguém sempre sai perdendo.
No caso dos inchaços de torneios, quem perde é o futebol como um todo.
Nossa cartolagem é uma triste caricatura da nossa "elite" política. Não seria saudável uma revolução jacobina que cortasse (metaforicamente, claro) algumas cabeças?

Jogos-treinos
São Paulo e Corinthians golearam seus fracos rivais no meio da semana. Foram, na verdade, treinos para o clássico de amanhã pela final paulista. Serviram também para deixar os oponentes em alerta. Depois de fazer cinco gols no São Raimundo, Luis Fabiano deverá ser vigiado de perto. O mesmo vale para Gil, que voltou com tudo contra o Strongest. Agora é briga de gente grande.

Retrocesso na seleção
Já critiquei aqui a insistência de Parreira em Cafu, Belletti e Emerson, quando há novos jogadores que podiam ser testados em suas posições. A volta de Cris é outro retrocesso, diminuindo a chance de novos zagueiros de destaque, como Anderson, do Corinthians, e Alex, do Santos.

E-mail jgcouto@uol.com.br


Texto Anterior: Motor - José Henrique Mariante: Fantasy GP
Próximo Texto: Boxe: Popó luta com ranqueado à última hora
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.