São Paulo, terça-feira, 15 de março de 2005

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Cartola "Cinderela" ergue império no futebol do PR

Dirigente com mais de R$ 10 mi em dívidas e condenação à prisão conduz três clubes no Sul

KLEBER TOMAZ
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

Como a personagem do conto de fadas Cinderela, obrigada a voltar para casa antes da meia-noite para "não virar abóbora", Aurélio Almeida, 43, dono de três times no Paraná, também tem de se recolher nesse horário, mas sob o risco de ir de novo para a cadeia.
"Posso até sair por aí e mentir, mas e se alguém me vir? Sou pessoa pública, muitos me vigiam", diz Almeida, presidente do Império do Atleta de Futebol Ltda., dona do Império do Futebol, Grêmio Maringá e Real Brasil.
Condenado à prisão em 2003 por estelionato (comprou quatro carros, mas não pagou) e usurpação de função pública (levou uma milícia armada ao tribunal de Chapecó-SC), o cartola, que já esteve preso, cumpre parte da pena de 39 meses em regime aberto desde 23 de janeiro de 2004.
"Sou inocente. Meu primo comprou os carros, com cheque roubado da minha mulher. Na outra condenação, não sabia que meus seguranças [policiais contratados] foram armados no tribunal", defende-se o empresário, natural de Nonoai-RS e que nos tempos de atleta era apelidado de Índio. Para não ser preso de novo, ele deve seguir regras. A principal é não estar na rua após as 24h.
As outras são não sair de Curitiba por mais de cinco dias sem autorização judicial, portar arma, tomar bebida alcoólica ou ir a bares. Deve prestar oito horas semanais de serviços comunitários.
Antes, Almeida tinha de se recolher às 22h, mas pediu para voltar para casa às 24h para poder acompanhar os jogos do Império. Sua condenação termina em junho de 2006. Apesar disso, já entrou com pedido de indulto.
Quem provavelmente não perdoará Almeida são seus credores. "Minha dívida com eles é de mais de R$ 10 milhões", diz o cartola.
Mesmo com a imagem abalada, o dirigente amplia seu "império". Criou, neste ano, o Real Brasil, que deve disputar a segunda divisão do PR. "Negocio atletas. É da venda deles para fora que vem o dinheiro de meus clubes", conta Almeida, que foi autorizado a ir três vezes ao México negociar.
Recentemente, viu o Império ganhar repercussão nacional. O time, que não tem estádio próprio -aluga o Erton Queiroz, do Paraná Clube- tomou do Atlético-PR um gol que não aconteceu.
Já o Grêmio Maringá foi comprado por R$ 260 mil em 2002 e também estará na segundona.
Marcílio Krieger, especialista em direito esportivo, declara ser possível um condenado presidir clubes. "O problema é se a pessoa for presidente de agremiações que disputam a mesma divisão." A Lei Pelé só proíbe sentenciados de presidirem federações ou confederações. "A lei foi criada para pegar a CBF e não os clubes."
Almeida não se preocupa e faz planos. "Talvez vire presidente do Real. Aí venderei o Grêmio Maringá." Segundo a federação do PR, ele preside só o Grêmio. Porém, no site do clube (www.imperiodofutebol.com.br) aparece como presidente do Império.
"É um erro, vou corrigir. O presidente é o Ademar Scarpelini", justifica Almeida, que até ontem, porém, não retificara a informação no site. Ele dirige seu "império" do sexto andar inteiro do Curitiba Trade Center, prédio comercial de luxo na cidade. "Comprei o andar de 900 m2 em 99 por mais de R$ 1 milhão", gaba-se.
Após ser indagado se aceitaria tirar fotos, pediu um "tempinho" para arrumar as melenas. "Espera um pouco, vou molhar os cabelos", pediu Almeida, que é definido como "portador de personalidade tomada pela vaidade e soberba" na sentença assinada pelo juiz Erminio Amarildo Darold.
Por causa da fama de mau pagador, suas equipes têm dificuldades de obter patrocínio. Sendo assim, não restou alternativa ao cartola senão a de firmar parceria com Deus na camisa do Império.
O dirigente estampou a inscrição "MT 6.33 em primeiro lugar",
em referência ao texto bíblico de São Mateus, capítulo 6, versículo 33: "Buscai pois primeiramente o reino de Deus e a justiça, e todas estas coisas se vos acrescentarão".
A fé também foi importante para Almeida suportar os sete meses e 20 dias em que esteve preso entre o centro de triagem de Curitiba, o presídio de Chapecó (SC) e a Colônia Penal Agrícola (CPA), em Piraquara (PR). Nesta última, protagonizou fato inusitado em 2004 ao levar o Grêmio para pré-temporada na cadeia. "Avaliei meu time, que, mesmo vencendo os presos por 6 a 0, caiu para a segunda divisão do Estadual."


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