São Paulo, terça-feira, 15 de março de 2005

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FUTEBOL

A alma do "Timón"

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE OPINIÃO

Eis que o Corinthians, depois do clamaroso papelão contra o Cianorte, fez uma partida animadora. E o mais animador foi ver Carlito Tevez atuando com desenvoltura, movimentando-se, passando e fazendo gol.
Aparentemente, a entrada de um jogador com as características de Bobô fez bem ao argentino, que parecia ter seus movimentos tolhidos com o vai-e-vem e as viravoltas de Gil pelas extremas. Gil é um bom jogador, que já jogou muito melhor e que talvez deva procurar outros ares para reencontrar seus dias de glória.
O fato é que essa equipe do Corinthians precisa jogar com um atacante mais enfiado, caso contrário tem tudo para ser apenas um time de armandinhos -ainda que de bons armandinhos.
A reação contra o Santo André veio mais do que na hora. Um novo fiasco criaria um clima muito difícil para "los chicos del Timón". Com a vitória, Daniel Passarela ganha um pouco mais de tranqüilidade. Mas isso ainda não não significa que as coisas estejam resolvidas.
Creio que o Corinthians tem diante de si um problema que poderá ou não superar: a preservação de sua "alma". Um grande time não se faz apenas com uma montanha de dinheiro e um punhado de estrelas. Menos ainda quando essas estrelas -que no caso ainda não passam de projeto de estrelas, começam a brigar.
Se não houver um compromisso do grupo com objetivos comuns, com a camisa, com a tradição -com o "espírito", enfim- do clube, as coisas podem desandar. O Real Madrid é um exemplo. Apesar de tantos excelentes jogadores, nada funciona. Virou um Bonsucesso de playboy.
Embora não tenha nenhum preconceito, creio que a invasão estrangeira no Corinthians, dentro e fora de campo, tem boas chances de produzir um curto-circuito cultural e descaracterizar a identidade corintiana. É uma boa possibilidade.
A outra, mais otimista, é que em se tratando de argentinos, têm eles características semelhantes às dos corintianos. São movidos a dramas e ganas, a tragédias e reações heróicas. A mística argentina é semelhante à do Parque São Jorge. E, nesse sentido, pode-se dizer que nada seria mais corintiano do que um argentino corintiano...
 
Numa coluna antológica, José Geraldo Couto tratou na semana passada da relação entre futebol e arte, ou melhor, daqueles lances e momentos em que ver arte no futebol é bem mais do que uma maneira de enfatizar a plasticidade de uma jogada ou de um lance.
E o gol de Ronaldinho Gaúcho contra o Chelsea foi realmente um desses casos em que a técnica, aliada à inspiração, transcende magicamente o repertório banal para criar uma situação inesperada, que nos deixou sem fôlego.
Como escreveu Zé Geraldo, "seja como for, quando a arte se manifesta, a gente percebe logo". E no caso do gol de Ronaldinho, a obra estava ali, irredutível, transportando-nos para uma outra dimensão.

Parreira e Zagallo
Nossa dupla dinâmica de treinadores da seleção considera que o Brasil não precisa contratar treinadores estrangeiros, pois os daqui são muito bons. Não concordo. O mercado brasileiro é grande, tem muito técnico enganador e há espaço para gente de fora. Passarella pode não ser genial e pode até não ser a melhor escolha para o Corinthians, mas não dá para sair julgando antecipadamente na base do corporativismo nacionalista. A propósito, nossas duas sumidades selecionadoras fariam melhor se prestassem mais atenção no futebol que se joga por aqui. Talvez assim não preferissem convocar Gustavo Nery, deixando de lado Léo e Junior. Já não bastava a insistência com Belletti... Está certo que as opções são escassas, mas essa foi difícil de engolir.

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