São Paulo, quinta-feira, 15 de abril de 2004

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TCU vê notas frias e licitação fantasma na Davis-2001 em SC

Tribunal aponta uso irregular de dinheiro público em obras para evento, que gerou desentendimento entre a federação catarinense e a confederação brasileira

FERNANDO ITOKAZU
GUILHERME ROSEGUINI
DA REPORTAGEM LOCAL

O confronto entre Brasil e Austrália pela segunda rodada do Grupo Mundial da Copa Davis de 2001, em Florianópolis, utilizou dinheiro público irregularmente.
Para a realização do evento, um dos motivos do rompimento entre a Federação Catarinense de Tênis e a confederação brasileira, foram simuladas licitações e utilizados documentos falsos.
Um convênio, no valor de R$ 1.104.195, foi assinado entre o Ministério do Esporte e Turismo e a Prefeitura de Florianópolis para viabilizar o torneio entre países.
Auditoria do Tribunal de Contas na União detectou várias irregularidades no emprego da verba.
O responsável pela assinatura dos contratos, Francisco de Assis Filho, secretário municipal de Transportes e Obras de Florianópolis, levou multa de R$ 7.000.
O texto foi encaminhado também ao Ministério Público Federal, que vai analisar se é o caso para a criação de uma ação penal.
A segunda rodada da Copa Davis ocorreu em Florianópolis entre os dias 6 e 8 de abril de 2001.
O Brasil, porém, só entraria na disputa se superasse o Marrocos na estréia, de 9 a 11 de fevereiro.
Com a vitória, no dia 19 de fevereiro, a CBT enviou uma notificação à Federação Catarinense confirmando a realização da Davis na capital de Santa Catarina.
Inicialmente, o convênio que traria o dinheiro para viabilizar a organização e a realização do evento seria firmado com a federação, mas acabou sendo direcionado à prefeitura do município.
A parceria entre o ministério e a cidade foi confirmada no dia 16 de março, e os recursos foram creditados sete dias depois. As obras, porém, já estavam em andamento. Como o contrato previa licitações, a prefeitura simulou, de acordo com o TCU, os processos de dispensa das mesmas.
O caso mais emblemático foi para a montagem da arena metálica. Três eram as candidatas. A prefeitura apresentou um relatório informando que todas haviam enviado a proposta coincidentemente na mesma data.
Mais: duas delas mandaram o documento pelo mesmo aparelho de fax, apesar de terem suas sedes registradas em diferentes cidades (Curitiba e São Paulo). Além disso, as duas proposições das empresas que perderam a concorrência não estavam assinadas e uma delas nem sequer continha nome da firma que faria o serviço.
Por fim, a vencedora Orpec Engenharia enviou o projeto à prefeitura no dia 9 de março, mas previa que o trabalho começaria em 12 de fevereiro.
Ou seja: a obra teria início quase um mês antes de a proposta chegar às mãos da prefeitura.
"Não resta dúvidas, portanto, que os processos de dispensa de licitação foram simulados, as contratações, na prática, foram realizadas anteriormente", diz o TCU.
A lista das irregularidades não pára por aí. A elaboração da estrutura de concreto, por exemplo, também gerou celeuma.
A montagem foi autorizada oficialmente pelo município no dia 12 de março. Só que, três dias antes, a empresa selecionada para executar as funções informou que o projeto já estava totalmente concluído e cobrava o pagamento pelas atividades realizadas.
Outro dado que saltou aos olhos dos auditores foi a seleção da instituição que ficaria encarregada de construir as quadras de tênis.
Novamente, o município informou que recebeu três ofertas. As duas empresas perdedoras não tinham sequer seu nome registrado no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ). Oficialmente, portanto, elas não existiam.
Ao ter acesso a cada uma das propostas, a auditoria notou uma semelhança: todas possuíam o mesmo padrão e incorriam nos mesmos erros de ortografia.
"Em vez de seguir o caminho da lei e procurar justificativas legais para abolir o processo de licitação, a Prefeitura de Florianópolis preferiu fazer uma grande simulação. Não nos restou outra alternativa a não ser multar os envolvidos", explicou Ubiratan Aguiar, relator do processo no TCU.
Além da apontada fraude com dinheiro público, a Davis de Florianópolis também envolve uma disputa financeira que culminou com a crise do tênis brasileiro.
A Federação de Santa Catarina cobra da CBT uma suposta dívida referente ao evento. Com o impasse, o relacionamento entre Jorge Lacerda Rosa, presidente de Santa Catarina, e Nelson Nastás, da CBT, nunca mais foi o mesmo.
Rosa, que tem ligações com Gustavo Kuerten, passou a fazer oposição à gestão de Nastás.
A pressão ganhou força com o boicote dos principais jogadores do país, liderados por Guga, na Davis. Derrotado, em casa, pelo Paraguai no último final de semana, o Brasil corre o risco de cair para a terceira divisão.


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