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FUTEBOL
De Gagarin a Kaká
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
No Brasil, pelo menos nos
grandes centros urbanos, cada vez menos gente vai aos estádios. Entretanto os novos astros
do futebol atraem uma atenção
cada vez maior da mídia, da publicidade e dos fãs que pouco ou
nada têm a ver com o esporte.
Dou um exemplo. Em 2002, numa das passagens do São Paulo
por Florianópolis, Kaká passou
uma tarde inteira no maior hipermercado da ilha distribuindo
autógrafos para uma multidão
composta sobretudo de meninas.
Segundo circulou na imprensa
local, a empresa teria pago a bagatela de R$ 30 mil de cachê ao
atleta por esse trabalho extracampo.
O jogador de futebol hoje faz
parte do circuito de celebridades
que inclui astros da música pop,
apresentadores de TV, atores,
modelos e figuras que nem sabemos bem o que fazem, mas que
"são alguém".
Num Festival de Cinema de
Gramado, há alguns anos, vi um
garoto abrir caminho a cotoveladas numa multidão até chegar
diante de um rapaz que ele desconhecia e que parecia ser o centro
do alvoroço. Sem saber se pedia
autógrafo ou não, resolveu perguntar antes: "Você é alguém?".
O mecanismo é mais ou menos
o seguinte: se tanta gente dá atenção a esse cara, eu também tenho
que dar. É o que se costuma chamar de "desejo mimético".
Alguém dirá: sempre foi assim.
Será que foi mesmo?
Procuro na memória as primeiras experiências de idolatria que
vivi ou presenciei. Lembro que
uma vez meu pai, que trabalhava
numa fábrica em Osasco, tomou
várias conduções para ir ao aeroporto de Congonhas ver de perto
um homem: Iuri Gagarin.
Procurei em vão durante anos o
livro em que meu pai recolheu o
autógrafo daquele ser mítico, o
primeiro homem que viu a Terra
do espaço.
Meu primeiro ídolo, pelo que
me lembro, tinha uma estatura
bem mais modesta.
Seu nome era Olímpio, e ele jogava no Azecar, um dos times de
várzea do meu bairro, a Previdência (entre o Butantã e a Vila
Sônia). Não sei se era bom de bola, mas eu ficava hipnotizado
com algo que ele fazia antes de o
jogo começar: girava por um tempão a bola na ponta do indicador,
como um artista de circo.
Só depois vieram os craques dos
álbuns de figurinha e dos times de
botão. Pelé era o único a ocupar
largos espaços na mídia e na publicidade. Não havia a profusão
de imagens que há hoje. O culto à
celebridade ainda engatinhava.
Alguns anos atrás, Alcino Leite
Neto, editor de Domingo da Folha, deu a meu filho um presente
de valor inestimável: um pedaço
de papelão com os autógrafos dos
atletas da seleção brasileira de 66.
Alcino era muito pequeno na
época, mas sua mãe o arrastou
para o hotel da cidade mineira
onde a seleção estava hospedada,
na preparação para a Copa do
Mundo. Para ele, não significavam nada aqueles rabiscos com os
nomes de Pelé, Garrincha, Gilmar, Gérson, Tostão...
Talvez o pequeno Alcino tenha
dito à mãe: "Eles são alguém?".
Valor da experiência
O Palmeiras pode selar hoje sua
volta à Série A. Se isso realmente acontecer, será interessante
observar o comportamento do
clube no ano que vem, depois
dessa temporada no purgatório. Para o bem ou para o mal,
nada será como antes.
Dupla do barulho
Tudo indica que Kaká venceu
Alex na disputa pela vaga de
Ronaldinho na partida de amanhã, diante do Peru, pelas eliminatórias da Copa de 2006.
Mas eu ainda gostaria de ver os
dois jogando juntos (saindo Rivaldo). Teria tudo para dar certo, com os dois tabelando e se
revezando na chegada à área do
time adversário. Cada um no
seu estilo: Alex fazendo o jogo
fluir com seus passes, e Kaká
arrancando em direção ao gol.
Por que não?
E-mail jgcouto@uol.com.br
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