São Paulo, domingo, 16 de maio de 2004

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África do Sul supera Marrocos por quatro votos e vai ser, em 2010, o primeiro país com maioria de negros a abrigar a principal competição do futebol

Finalmente a Copa é negra

RODRIGO BUENO
DA REPORTAGEM LOCAL

A Copa do Mundo, o maior evento do futebol, enfim é negra.
A histórica vitória de ontem da África do Sul na eleição para sede do Mundial-2010 é o triunfo de um grupo étnico que sempre foi associado à magia do esporte, mas que também sempre esteve à margem da única competição que rivaliza com a Olimpíada em termos de interesse no planeta.
Pela primeira vez na história a Fifa, entidade que controla o futebol mundial, deixa a sua ""menina dos olhos" nas mãos da África. Mas só um dos países que permaneciam candidatos a sede de 2010 até ontem apresenta uma população majoritariamente negra.
A África do Sul, que ficou marcada durante mais de 40 anos pelo apartheid, regime de segregação racial, tem 76% de negros e 13% de brancos, e agora, uma Copa do Mundo para fazer. Egito, Marrocos e Líbia, os concorrentes batidos pela campanha encabeçada pelo ícone negro Nelson Mandela, são países basicamente árabes.
Desde o Uruguai, que recebeu a Copa de 1930 e que se habituou a chamar os brasileiros de ""macaquitos", até a Coréia do Sul e o Japão, que fizeram em 2002 a primeira Copa para a maioria amarela, o Mundial barrou o negro.
Foram realizadas até hoje 17 Copas, sendo que nove aconteceram na Europa. A próxima, em 2006, também será no velho continente.
A América, o outro continente que recebeu várias Copas, não teve um país-sede com representação negra como a África do Sul.
Não foi à toa que o liberiano George Weah, o camaronês Roger Milla e o ganense Abedi Pelé, três dos negros africanos que mais destaque conseguiram no futebol mundial, eram alguns dos maiores defensores da candidatura sul-africana a sede da Copa.
Nelson Mandela, ex-presidente da África do Sul que ganhou um Nobel da Paz, já havia apelado para a questão racial em 2000, quando o seu país tentou pela primeira vez ganhar a organização de um Mundial de futebol. Uma estranha abstenção do neozelandês Charles Dempsey, porém, deu aos alemães a sede do Mundial-2006.
O prometido Mundial africano foi adiado. O negro camaronês Issa Hayatou tentou então alcançar a presidência da Fifa, mas não conseguiu desbancar o suíço Joseph Blatter, o homem que garantia já em 2006 a Copa na África.
Ontem, Blatter fez o anúncio oficial da vitória sul-africana. Era certo que o Mundial seria realizado no continente devido a um rodízio definido nos últimos anos, mas o desejo de alguns europeus de ver a Copa africana ser o mais perto possível do velho continente era um último obstáculo a ser transposto pela África do Sul.
O Comitê Executivo da Fifa, com 24 membros, deu 14 votos aos sul-africanos. Os marroquinos, únicos que pintavam como real ameaça, tiveram dez votos. Placar mais folgado que o da derrota do país de Mandela para a Alemanha na eleição passada (12 a 11). Egito e Líbia zeraram.
""O ganhador é a África. O ganhador é o futebol", disse Blatter após anunciar o resultado.
Milhares de pessoas, negros e brancos de várias etnias, saíram às ruas de Johannesburgo, Cidade do Cabo e Pretória para celebrar a conquista, sinal de que o maior apelo sul-africano para organizar o torneio, a integração racial no país, é de fato uma realidade.
A África do Sul já recebeu formalmente diversas manifestações de apoio e felicitações pela épica vitória. ""Será um grande anfitrião", disse, por exemplo, Franz Beckenbauer, maior lenda do futebol alemão e chefe da candidatura vencedora da Copa-2006.
Danny Jordaan, homem que liderou a campanha sul-africana, falou emocionado em justiça. ""O sonho virou realidade. Não teremos que esperar outros cem anos. Quero que todos saibam o que significa termos ganho a Copa. Há muitas pessoas sem dinheiro, sem trabalho e até sem comida, mas com muitas esperanças e agradecidas por essa vitória."


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