São Paulo, domingo, 16 de julho de 2000


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Polêmica cerca aniversário da maior e mais trágica derrota do futebol nacional

Traves provam que, aos 50, Maracanazo vive

Agência O Globo
Com o goleiro Barbosa batido, Bigode (com as mãos na cabeça) e Juvenal (esq.) observam o segundo gol do Uruguai na final da Copa de 50, marcado po Ghiggia, que abre os braços para comemorar


DA REPORTAGEM LOCAL

Faltavam 11 minutos e 28 segundos para o Brasil conquistar o seu primeiro título mundial quando o ponta-direita Alcides Edgardo Ghiggia venceu Bigode na carreira, deu a impressão que ia cruzar, enganando a defesa da seleção, e chutou.
Eram 16h34 do dia 16 de julho de 1950. A bola passou entre o goleiro Barbosa e a trave esquerda. O Uruguai fazia 2 a 1 no Maracanã e seria o campeão, na primeira e única Copa do Mundo no Brasil.
Hoje, exatos 50 anos depois, o Maracanazo (expressão espanhola pela qual ficou conhecida a derrota) ainda palpita. Está vivo como nunca deixou de estar, fazendo crer que jamais se apagará da história do país.
Ao contrário, a efeméride acordou um fantasma sempre à espreita, trouxe de volta mais uma vez os personagens da tragédia, despertou emoções, reacendeu algumas polêmicas e criou outras.
Como uma mãe que busca eternamente explicações para a inesperada morte do filho e, inconformada, insiste em guardar lembranças do morto, os brasileiros seguem remoendo o episódio.
Agora, a lembrança exumada é a das traves fincadas naquele dia na grama do Maracanã.
A questão: aonde foram parar as balizas?
O jornalista Roberto Muylaert, no recém-lançado livro "Barbosa - um gol faz cinquenta anos", contou que o goleiro brasileiro ganhou a meta de presente e usou-a como lenha para um churrasco.
A informação, porém, vem sendo contestada em várias frentes.
A Prefeitura de Muzambinho, interior de Minas, diz que as traves estão na Casa da Cultura da cidade. Pela versão, foram doadas em 1961 pela Adeg, então administradora do Maracanã, por ocasião de um série de amistosos que a seleção carioca faria na região.
Após os jogos, foram transferidas do estádio municipal para um campo na zona rural, de onde só saíram na última quarta, para exposição na Casa da Cultura.
Nos dois casos, o motivo da doação pela Adeg foi a troca, por ordem da Fifa, das traves quadradas por outras arredondadas.
A Folha ouviu o trecho da entrevista em que Barbosa faz a revelação a Muylaert, realizada no início deste ano, meses antes da morte do goleiro, em abril.
"Diz que você comprou as traves e fez uma cruz", questionou Muylaert, em referência a uma das lendas da derrota.
"Não, eu fiz uma fogueira. Ganhei de presente e fiz uma fogueira", respondeu Barbosa.
Muylaert diz que não procurou checar a informação, até então inédita, "por uma simples razão: meu livro não é de pesquisa, mas um depoimento". "Não sei se é verdade, mas foi o que ele falou."
Mas não é só Muzambinho a tentar polemizar com Muylaert.
O escritor Ruy Castro, em resenha publicada em "O Estado de S. Paulo", ironizou a versão de Muylaert: "(...) traves estas que só na rica imaginação de Roberto Muylaert ele (Barbosa) queimou para fazer um churrasco".
Em entrevista à Folha, Zizinho e Jair, jogadores do Brasil em 50, classificam a versão do livro como "mentira" e "invenção".
Por sua vez, o principal pesquisador do Maracanazo, Paulo Perdigão, diz jamais ter ouvido uma ou outra história.
Um dos maiores conhecedores do Maracanã, Isaías Ambrósio, guia e "enciclopédia" do estádio, do qual fundou os alicerces, em 1948, se mostra alheio à polêmica.
"As duas versões chegaram a mim, mas não levei em conta, porque não tenho interesse. Não sei mesmo o que foi feito das traves", afirma. (FÁBIO VICTOR)


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