São Paulo, terça-feira, 16 de agosto de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

BASQUETE

Família trapo

MELCHIADES FILHO
EDITOR DE ESPORTE

A semana de Fabricio Oberto estava uma confusão. Pedido de liberação para a Federação Espanhola, rescisão do aluguel, empacotamento da mudança, solicitação de visto de trabalho, releitura do contrato de US$ 7 milhões com a NBA. Mas o argentino de 30 anos, campeão olímpico e vice mundial, prestes a dar o passo mais ambicioso da bem-sucedida carreira, mesmo com a cabeça a mil, não se deslumbrou nem sucumbiu à agenda. Achou um tempinho, sentou-se ao computador e batucou o e-mail.
Sugeriu aos garotos que não se impressionassem com o torneio, que não se preocupassem com a flutuação do rendimento em quadra. Revelou que, na idade deles, ficou assustado. Desejou sorte.
O pivô do San Antonio não foi o único da seleção principal a mandar alô para a equipe sub-17, enfurnada na Venezuela para o Sul-Americano. Sánchez, Palladino, Kammerichs e Gutiérrez também escreveram espontaneamente.
Mensagens simples, quase tolas, mas que fizeram diferença na conquista do título. A comissão técnica leu-as no vestiário e no alojamento, sempre que os meninos pareciam macambúzios.
Infelizmente a única "família do basquete" do Brasil é a que reúne os que desfrutam da crise que abateu a modalidade. No resto, prevalece o cada um por si.
Não viviam nossos principais atletas a condenar as condições do Nacional organizado pela CBB, da tabela malfeita ao desconforto do transporte rodoviário? Seria natural que se unissem em torno do plano da liga interclubes independente. Nada disso.
Boa parte não hesitou em negociar com os poucos clubes que permaneceram fiéis à CBB -sem exigir nenhuma contrapartida além do salário. Do grupo que vai à Copa América, por exemplo, somente um (Murilo, do Franca) se alinhou com os "rebeldes".
Aos amigos e aos repórteres em "off", os convocados não hesitam em condenar o uniforme, em reclamar do equipamento dos treinos, em fazer pouco do conhecimento tático dos treinadores.
Em público, elogiam seus próprios feitos ou se calam. Deixam Nenê, que se dispôs a gritar, à mercê do revide do establishment.
(Eu mesmo cheguei a desconfiar da razão do boicote do pivô. Jogar a Copa América seria "inconveniente" para um atleta em ano final de contrato, que não quer correr o risco de contusão. Mas ele desfez minhas dúvidas ao anunciar que manterá o protesto no Mundial-2006, quando já terá assegurado os milhões da NBA.)
Diante dos microfones daqui, os atletas aplaudem o momento do basquete no país e dizem que "lá fora eles fazem tudo igual".
Longe, baixam a guarda. Como Lucas Tischer, após um mês em Phoenix: "Eu nunca tinha chegado a esse nível de exaustão. E olha que os trabalhos não foram físicos, e sim de fundamentos". É bom esclarecer que o pivô já foi treinado por Lula Ferreira...
O técnico da seleção, aliás, adora repetir que "o lobo é a força da matilha, e a força da matilha é o lobo". A frase feita, bocó, ganha sentido. No nosso basquete, para a alegria dos conservadores, o homem é só o lobo do homem.

Presente de grego 1
Em maio, Adonis Sousa, 14, talento do basquete brasileiro, aceitou o inesperado convite do Olympiakos e se mandou para Atenas. O presidente da CBB, Gerasime Bozikis, nascido na Grécia, disse que era estupidez: "Não devemos nada em termos de organização nem em parte técnica aos gregos. Somos muito melhores". Domingo, os gregos ganharam a prata no Mundial sub-21. Há dois anos, no sub-19, levaram o bronze. O Brasil? Nem se classificou para as duas edições.

Presente de grego 2
O Mundial sub-21 disparou outro alerta na direção do Brasil. O bloco das Américas obteve seu melhor desempenho em torneios de base, com os quatro representantes entre os sete primeiros: Canadá (3º), EUA (5º), Argentina (6º) e Porto Rico (7º). A Lituânia obteve o ouro.


E-mail: melk@uol.com.br

Texto Anterior: Técnico testa substituto a Ronaldinho
Próximo Texto: Futebol - Marcos Augusto Gonçalves: Carlitos, Roger e muitos gols
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.