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MOTOR
Lawrence
JOSÉ HENRIQUE MARIANTE
EDITOR-ADJUNTO DE ESPORTE
A mitologia grega diz que
os heróis estão entre os deuses e os homens. Não são um nem
outro, ficam no meio do caminho.
A mitologia dos nossos tempos,
se é que existe uma, simplifica
bem o processo. Na falta de deuses
e diante de uma massa ignara e
sedenta, pinça meia dúzia que
merecerá os louros e o olimpo
através de diferentes processos lucrativos. Mas, como disse certa
vez Martina Navratilova, a diferença entre o artista e o esportista
é que um atua e o outro tem que
fazer de verdade. Exatamente por
isso, por fazer de verdade o que
poucos conseguem fazer, acabam
sendo chamados de heróis.
Faz sentido, portanto, chamar
Senna de herói. Só que dez anos
depois, não adianta mais lembrar
os feitos extraordinários. É preciso ir além, explicar como ele conseguiu fazer isso ou aquilo.
O mérito da nova biografia sobre Senna, lançada nesta semana
pelo jornalista Ernesto Rodrigues,
curiosamente não é esse. "Ayrton,
o herói revelado" desce a detalhes
incríveis, como a cor do Escort
XR3 que o então jovem piloto esmerilhava entre Santana, Morumbi e a rua Augusta, mais para
qualificar o herói, algo que certamente faltava. O Senna descrito
por Rodrigues é angustiado, conturbado, dividido, falível, delicado, entre outros adjetivos difíceis
de atribuir a alguém como ele.
Até e imediatamente após a sua
morte, Senna era uma espécie de
herói clássico, sem poréns ou apesares. Seus momentos de virulência na pista, por exemplo, eram
explicados como sentido de justiça. Os boatos sobre sua masculinidade, como inveja alheia.
Nada disso muda no livro, mas
aprendemos que Senna era tão ou
mais virulento fora da pista
-suas negociações com a Lotus
beiram o maquiavélico- e que a
atitude olímpica diante dos falatórios de Piquet e as soluções encontradas o incomodavam muito
mais do que se imaginava.
Enfim, Senna deixa de ser o herói clássico, ganha fraquezas e até
sexo, não o de revista de fofocas,
mas aquele que qualquer mortal
enfrenta entre quatro paredes.
Uma aura frágil, que nada lembra o caráter "predador", como
bem descreve o livro, de quem
saía à pista nos treinos oficiais
para desmoralizar o resto do grid.
Ou de quem foi capaz de premeditar, sempre segundo o livro, um
acidente a mais de 200 km/h.
O livro também não permite
identificar Senna como um herói
pueril, tipo Skywalker, que está lá
por uma causa maior, talvez a
imagem que mais o popularizou
entre os brasileiros, de donas-de-casa a fanáticos. Sua causa era
própria e sua personalidade tinha
diversos momentos de Hans Solo.
Senna era ao mesmo tempo tímido e eloqüente, vingador e sanguinário. Como um Lawrence da
Arábia -comparação que fará
muitos leitores me colocarem ao
lado de Piquet, não é o caso-, o
estrangeiro que conseguiu reunir
toda uma nação sob seu comando, ainda que incapaz de lidar
com seus dilemas pessoais.
Senna odiava o universo pegajoso e imoral da F-1. E, no lugar
de praguejar, fez a mesma admitir que o diferente, o incomum, o
inalcançável, era ele. Só ele.
A F-1 se rendeu a Senna.
Schumacher
Herói do nosso tempo, Schumacher não disse, ao contrário do que
muita gente publicou, que pensou em se aposentar. Afirmou que
chegou a se perguntar se agüentaria o tranco, o que é bem diferente.
Valentino
Outro herói do nosso tempo, o italiano fez a pole provisória ontem
em Welkon, com aquela moto da Yamaha que até o final do ano passado era uma porcaria. O Mundial desta temporada valerá a pena.
Indy?
Como o negócio formalmente acabou e neste final de semana começa de novo -fecharam o grid mínimo de 18 carros nesta semana-,
o nome também mudou. A partir de agora, vamos de Champ Car.
E-mail mariante@uol.com.br
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