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JOSÉ GERALDO COUTO
Almanaques de Babel
Os guias do Brasileirão expõem alegremente a fecunda diversidade étnica, geográfica
e cultural do nosso futebol
COM O INÍCIO dos campeonatos
nacionais das séries A e B,
chegaram às bancas os já tradicionais "guias do Brasileirão". São
vários: o da "Placar", o do "Lance", o
da "Trivela". Compro e devoro todos, ávido como um menino montando seu álbum de figurinhas ou
seu time de futebol de botão.
Mas não é só a nostalgia da infância que me leva a essas páginas, e sim
a percepção de que nelas se registra,
para quem souber ver e ler, boa parte da nossa cultura viva.
As meras fichas dos jogadores
-são uns mil, somadas as duas divisões- são uma fonte inesgotável de
informação e deleite. Ali há apenas,
no mais das vezes, o rosto do atleta,
seu nome e apelido, peso e altura e o
local onde nasceu.
É um painel da diversidade étnica
e cultural brasileira. Que bom que os
times de futebol não precisam estabelecer "cotas" para minorias. Estão
todas presentes em toda parte -e há
tanto tempo que já nem nos damos
conta. Haverá um dia, espero, em
que veremos com a mesma naturalidade essa massa heterogênea ocupando os bancos das universidades,
as mesas diretoras de empresas, os
laboratórios de pesquisas avançadas, os gabinetes de governo.
As cidades natais dos jogadores
são um capítulo à parte. O goleirão
Marcos, do Palmeiras, colocou a pequena Oriente (SP) no mapa. Ele deve ser o herói local, com direito a estátua na praça da matriz. Rogério
Ceni fez o mesmo pela paranaense
Pato Branco, que agora tem outro filho ilustre, o craque Alexandre Pato.
Digo isso porque venho de uma cidade -Jaú (SP)- que até hoje cultua seus heróis da bola: Edu, Afonsinho e Sormani.
No futebol, a origem geográfica do
atleta não o discrimina. Serve, muitas vezes, como fator de distinção,
carinhosamente incorporado ao nome: Alex Mineiro, Marcelinho Carioca, Alan Bahia, Carlinhos Paraíba, Wilton Goiano, Augusto Recife.
Às vezes o toponímico também
serve para confundir, como no caso
do pernambucano Marquinhos Paraná, do gaúcho Mineiro, do paranaense Tcheco e do paulista Fernando Baiano. Os apelidos não devem ser tomados ao pé da letra. Tem
Careca que é cabeludo, Preto que é
branco e Azul que é mulato. Por isso
é bom ter a fotinho do lado.
Já falei aqui sobre a miríade de nomes estrangeiros. Todos os clubes
têm os seus Wellingtons, Washingtons, Wallaces, Charles, Christians.
Os nomes inventados pela criatividade da geléia geral brasileira são
bem mais interessantes: Maicosuel,
Keirrison, Richarlyson, Kerlon,
Maylson, Réver, Cléverson, Leyrielton, Gleidson, Uendel, Maycon.
Daria para formar times inteiros
com nomes de celebridades do passado ou do presente: Elvis, Ben-Hur,
Allan Delon, Xuxa, Alan Kardec, Lúcio Flávio, Fernando Henrique. E
outro com xarás de craques, com os
quais convém não confundi-los: Didi, Gérson, Da Guia, Romário, Dida.
Há ainda os sobrenomes que parecem apelidos: Max Carrasco, Alex
Terra, Élder Granja. Mas imbatíveis
mesmo, em sonoridade e significado, são as combinações únicas nome-apelido: Valdir Papel, Eduardo
Arroz, Márcio Mixirica, Gabriel
Pimba, Rodrigo Mancha e este fabuloso Wellington Saci, que concentra
num pentassílabo toda a poesia do
nosso babélico futebol.
jgcouto@uol.com.br
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