São Paulo, quarta-feira, 18 de julho de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

FUTEBOL

A magia da nova camisa

TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA

O ser humano é facilmente sugestionado pelas lendas, superstições, mitos, magias e hábitos. Finge que é racional, mas morre de medo das bruxas, do mistério, do destino e do castigo dos deuses. Diante das incertezas do resultado de um jogo (futebol é uma caixinha de surpresas) e dos maus olhados, o atleta se apega ainda mais ao sobrenatural.
Jogador só funciona se entrar em campo com o pé direito, beijar a medalhinha duas vezes e vestir uma camisa debaixo da oficial, com os dizeres: "Jesus salva!"
Gestos simbólicos como esses e a entrada de mãos dadas em campo na Copa-94 exercem, momentaneamente, uma forte influência positiva nos jogadores. Ao mudar a cor da camisa da seleção, Felipão quis também incendiar a alma dos atletas. O mais importante não são os fatos, e sim a idéia que se tem dos fatos. É a onipotência do pensamento.
Para a tristeza da torcida do Atlético-MG, a camisa azul pode se tornar o novo símbolo de transformação da seleção. Até perder. Aí volta para a amarelinha.

Vitória bem-vinda
Ufa! Enfim, a seleção venceu! Não importa se o Peru é fraco e estava desfalcado, como todos, inclusive o Brasil. Foram belíssimos gols. Quem sabe é o início de uma grande recuperação? A atuação não entusiasmou. Melhor assim. É mais sensato ir melhorando aos poucos. Devagar e sempre. Será uma longa caminhada.
O futebol desejado está muito distante. Mesmo com os graves problemas estruturais do futebol brasileiro e com a falta de excepcionais atletas, creio que é possível formar um ótimo time, capaz de se classificar e ganhar a Copa.
Pela primeira vez após a derrota na Copa-90, a seleção jogou com três autênticos zagueiros. É um bom esquema para se atuar ofensivamente, pressionando o rival. Não dá mais para atuar no ataque com dois zagueiros marcando dois atacantes, sem sobra, e com os laterais avançando.
A maior parte das principais seleções da Europa, como França, Espanha, Holanda e Inglaterra, atua com dois zagueiros e dois laterais. A diferença é que os laterais desses times são muito mais marcadores do que apoiadores.
Muito mais importante do que o desenho tático é a qualidade dos jogadores. Na Copa-90, a seleção de Lazzaroni era muito defensiva. Além dos três zagueiros, havia dois volantes (Dunga e Alemão), e os dois alas (Jorginho e Branco) eram muito mais marcadores do que apoiadores. O outro armador (Valdo) atuava pelos lados. Os atacantes, isolados.
Contra o Peru, o time também ficou defensivo. Não pressionou a saída de bola, e os três zagueiros e dois volantes jogaram recuados.
Antes de ir à Colômbia, Felipão me disse que o Juninho Pernambucano é o melhor, e talvez o único, armador brasileiro capaz de atuar bem na defesa e no ataque. Concordo. Deduzo que o jogador não foi escalado desde o início porque ainda está fora de forma.
Ricardinho, do Corinthians, também poderia se adaptar a essa dupla função, além do Vampeta, quando recuperar a forma. Não se deve é jogar com dois volantes estáticos e três zagueiros, como aconteceu contra o Peru.
Belletti (jogou bem) e Júnior atuaram como laterais, e não como alas. Os verdadeiros alas são armadores. Têm liberdade para avançar no meio, trocar passes e fazer gols, como meias ofensivos.
Felipão não deveria se impressionar com a boa atuação da seleção nos últimos 20 minutos. Eram 11 contra 10. Abriram-se grandes espaços na intermediária e na defesa do Peru. Ficou fácil para os velozes e habilidosos Denílson e Juninho. Se entrassem no início do jogo, seria bem diferente.
Faltam ao atual futebol brasileiro atacantes fora de série. Romário é, hoje, uma incógnita. Rivaldo não se acerta no time brasileiro. O jovem Ronaldinho, sem clube, está parado. Ronaldo, o fenômeno, é a grande esperança.
Se esses quatro (pelo menos dois ou três) estiverem em forma na Copa, pode preparar a festa.
Na melhor exibição nos últimos anos, contra a Argentina, em Porto Alegre (local do próximo jogo com o Paraguai), estavam os dois Ronaldos e Rivaldo. No outro ótimo jogo com a mesma Argentina, em São Paulo, jogaram Rivaldo e Ronaldinho. Se na Copa-98 estivesse a dupla Ro-Ro (Romário e Ronaldo), além do Rivaldo, as chances seriam enormes.
Hoje, contra o Paraguai, espero uma nova vitória com a camisa azul e ver a seleção jogar um pouco melhor do que contra o Peru. Nada mais do que isso. O importante é a equipe evoluir, ganhar confiança e definir um caminho.

E-mail
tostao.folha@uol.com.br



Texto Anterior: Por que Nadia é 10
Próximo Texto: Panorâmica - Natação: Popov não deve participar do Mundial de Fukuoka
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.