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FUTEBOL
Dinheiro, diploma e dentes
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
É incrível como ainda tem
gente que acredita que basta
elevar o preço dos ingressos para
os estádios ficarem limpos e bem
equipados.
Os relatos transcritos aqui pela
Soninha, anteontem, sobre o que
ocorreu no Morumbi no jogo Brasil x Bolívia mostram que não é
bem assim.
O poeta e compositor Carlos
Rennó me contou uma história
parecida. Ele pagou os tubos por
lugares para a família na arquibancada e teve de assistir àquele
jogo em pé porque tinham sido
vendidos mais ingressos do que o
setor comportava.
Quando lamentei aqui o preço
do ingresso e a ausência de torcedores pobres no Morumbi, um leitor me respondeu que só assim
era possível manter o estádio limpo e seguro.
Por esse raciocínio, gente sem
dinheiro é sinônimo de sujeira,
bagunça e violência. Nunca ficou
tão claro, para mim, o preconceito de parte da elite e da classe média diante dos pobres em geral.
Só assim se explica que se prefira ver no estádio 5.000 pessoas
pagando R$ 30 por ingresso a ver
30 mil pagando R$ 5, o que daria
rigorosamente a mesma renda.
Vou repetir o que já escrevi aqui
em outra ocasião: o que muitos
querem é afastar o Brasil real dos
estádios, criar uma redoma artificial de "Primeiro Mundo" num
país de maioria pobre ou miserável. Essa redoma, aliás, já existe,
pois foi realizada uma limpeza étnica e social delimitando áreas de
acesso virtualmente exclusivo a
quem tem dinheiro: os bairros salubres, os shopping centers, os cinemas, as boas escolas etc.
Dos demagogos de direita aos
radicais de esquerda, dos sem-terra às redes de TV, todos discursam contra a exclusão social, mas
são poucos os que se dão conta de
como esse processo se dá no dia-a-dia, a cada evento banal como a
elevação do preço de um ingresso,
o fechamento de um cinema popular ou o fim de uma linha de
ônibus na periferia.
Todo regime de exclusão é odioso. Na socialista Cuba e nas capitalistas Bahamas, há praias exclusivas para ricos e turistas, nas
quais a população preta e pobre
local não pode pôr os pés.
O Pelourinho, em Salvador, foi
restaurado e embelezado ao preço da remoção compulsória dos
antigos moradores, quase todos
negros e pobres. Ficou lindo e seguro, mas é como um museu para
turistas, artificial e sem vida.
Imagine o mesmo processo em
escala nacional. Que tipo de país
estamos criando ao varrer para
as periferias cada vez mais estragadas os excluídos do banquete
social? Que tipo de sociedade
construímos ao privar a maioria
da população dos mais básicos
bens culturais e de lazer?
Haja polícia para afastar tantos
seres feios, sujos e malvados. Haja
cadeias para encarcerar os que se
rebelarem. Haja vidro à prova de
balas.
Posso ser o último otário do
mundo, mas ainda acho que é
possível fazer as coisas de outra
maneira e que os prazeres da vida
não devem ser um privilégio de
quem tem dinheiro, diploma e todos os dentes.
Clube da Luluzinha
Para compensar o tom azedo
da coluna de hoje, lembro um
fato animador, noticiado em
ótima reportagem publicada
ontem neste caderno por Márvio dos Anjos: a criação da torcida organizada Sereias Santistas. Tomara que a onda pegue e
que outras torcidas tenham as
suas alas femininas. Os estádios
com certeza vão ficar mais alegres e bonitos.
Copa dos Campeões
Dois golaços. O do brasileiro
França, pelo Bayer Leverkusen
contra o Real Madrid: na quina
esquerda da grande área, virou
o corpo, levantou a cabeça e
chutou no ângulo oposto. E o
de Nedved, da Juventus, contra
o Ajax: Del Piero deu um passe
de curva, Zambrotta escorou
para o tcheco, que acertou o ângulo com rapidez e precisão.
E-mail jgcouto@uol.com.br
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