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Enfermeiro Pet remenda ferimentos do Flamengo
Aos 37 anos, meia comanda a reação do time carioca, rival do Palmeiras hoje
Jogador sérvio diz que vai torcer para Sérvia, Brasil, Espanha e Itália na Copa e que deve continuar no país depois de encerrar a carreira
MÁRIO MAGALHÃES
DA SUCURSAL DO RIO
Formado auxiliar de enfermagem no ensino médio da
Sérvia, Dejan Petkovic não padeceria de falta de trabalho se
tivesse continuado em meio
aos massacres e às guerras na
antiga Iugoslávia.
Sem nunca ter exercido a
profissão para a qual estudou,
ele foi embora para a Espanha
aos 22 anos, desembarcou dois
anos mais tarde, em 1997, no
Vitória-BA e nos últimos meses
se dedica a remendar ferimentos do Flamengo.
Depois da ciclotimia anterior, a equipe não perde há oito
partidas, planeja atingir o G4
do Campeonato Brasileiro
-começou a rodada a dois pontos da vaga na Libertadores- e
está a nove do líder Palmeiras, o
antagonista de hoje.
Se o artilheiro rubro-negro e
da competição é o "imperador"
Adriano, com 15 gols, em campo o general é Petkovic.
É dos seus pés -ele chuta
bem com os dois- que sai a
maioria dos cruzamentos, 25,2
por jogo, aponta o Datafolha.
Aos 37 anos, idade provecta
para um futebolista, Pet consagrou a condição de comandante
no sábado retrasado.
O Flamengo perdia para o
São Paulo por 1 a 0 no Maracanã. Na primeira cobrança de
um pênalti por Pet, Rogério Ceni defendeu, mas o árbitro
mandou repetir.
O lateral Éverton Silva animou-o: "Ô, pai, você é nosso
ídolo. Não vai um pênalti tirar
isso de você. F...-se o pênalti".
Pet converteu com classe e
deu o passe decisivo para o gol
da vitória. Anteontem, a manchete do recém-lançado jornal
esportivo "Campeão" era "Pet
vira o pai da nação". Há outros
três diários esportivos no Rio,
um deles dedicado exclusivamente à "nação rubro-negra".
Essa massa acolhe agora o
meia que chegou em junho
mais por baixo que refugiado
de guerra. O então técnico do
clube, Cuca, e os cartolas do futebol rejeitaram a contratação.
A direção do Flamengo a impôs, menos interessada no atleta desempregado do que em um
acerto com Pet acerca de uma
dívida trabalhista -a volta era
condição para o acordo.
Ele topou e já marcou quatro
gols no Campeonato Brasileiro.
É o vice-artilheiro do time,
atrás somente de Adriano.
Na virada do século Petkovic
defendera o clube, pelo qual
anotou o gol decisivo do Estadual do Rio de 2001 contra o
Vasco -aos 43min do segundo
tempo; por isso, seu número
atual é o 43.
No racha político rubro-negro, a nova batalha é a campanha eleitoral. Sete candidatos
almejam a presidência.
Para quem cresceu na região
dos Bálcãs, o clube balcanizado
em várias facções não intimidou. Nem a má vontade de Cuca, logo trocado por Andrade.
Os treinadores de seu país
não o convocam há mais de dez
anos. Pet bateu boca com um
deles, mas vieram outros. Por
que não o chamam?
"Longe dos olhos, longe do
coração", arrisca à Folha, sobre
a distância desde que trocou
em 1995 o Estrela Vermelha, de
Belgrado, pelo Real Madrid, no
qual não se firmou. Ironiza:
"Talvez eu jogue em um país
onde o futebol seja ruim".
Ele diz não ter saudade da
velha Iugoslávia, a união de seis
repúblicas dilacerada em conflitos na década de 1990. Porém
lamenta o fim: "Sempre sou pela união, não pela separação".
Não guarda boas lembranças
de Slobodan Milosevic, o ditador sérvio afastado em 2000 e
que morreu seis anos depois
acusado de crimes de guerra.
"A memória é totalmente negativa. No governo dele, aconteceram as piores coisas para o
meu povo, o povo inocente,
guerras, matanças."
Não está nem aí para Bósnia--Herzegóvina e Eslovênia, seleções de países oriundos da ex-Iugoslávia que tentam vaga para 2010 no mata-mata europeu
-a Sérvia já se classificou.
Pet diz que torcerá na Copa
para Sérvia, Brasil ("sou sérvio
e meio brasileiro"; é casado
com uma sérvia), Espanha (terra de nascimento de uma filha)
e Itália (da outra, caçula).
Vê a Argentina forte. "O problema é a zaga. Se arrumarem a
zaga, serão perigosos", prevê
em português escorreito.
Ele promete ficar no Brasil
após o fim, sem data, da carreira. Admite ser técnico. "Futebol tem tática e estratégia", diz.
"Não é só briga. A guerra também tem estratégia."
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