São Paulo, domingo, 19 de abril de 1998

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Mil e uma noites

Candinho, João Paulo Medina e equipe chegaram para comandar o Al-Hilal. Programaram um churrasco no primeiro fim-de-semana e mandaram o preparador de goleiros, brasileiro, a um açougue. Mas, na Arábia, a carne de carneiro é a mais popular. Sem saber inglês ou árabe, o preparador arranjou um jeito de dizer ao açougueiro que queria carne de boi. Disse "méé" e mostrou com o dedo que não. Então, disse "muu", e fez sinal de positivo.

Nelsinho treinava o mesmo Al-Hilal. No início, surpreendeu-se quando todos os jogadores paravam em pleno treino para fazer suas orações, voltados para Meca. "Eles rezavam cinco vezes por dia", diz Flávio Trevisan. A solução encontrada: marcar o treino da tarde entre a penúltima e a última prece do dia, para evitar interrupções.

Em 84, os técnicos brasileiros na Arábia promoviam animados campeonatos de tênis. Nas finais, invariavelmente encontravam-se Telê Santana e Marinho Peres, os mais dedicados ao esporte. Wanderley Luxemburgo e Joubert Meira iam aos jogos só para atrapalhar. "A gente falava alto o tempo todo", conta Joubert.

O Al-Hilal, de Candinho, iria disputar a final da Copa do Rei, contra o Al-Nasr, de Joel Santana. Como os dois times eram de Riad, o clássico naturalmente seria realizado no estádio da cidade. Mas, excepcionalmente naquela semana, o rei estava despachando em Jidá. Resultado: o jogo foi transferido, e ambas as equipes jogaram longe de suas torcidas.

As mulheres de Nelsinho e Trevisan foram passear em um shopping center de Riad, sede do reinado e cidade onde os hábitos religiosos são mais controlados. Apesar de estar usando véu, a mulher de Trevisan foi interpelada por integrantes da polícia religiosa. "Foram estúpidos. E ela só estava com um fio de cabelo para fora", diz o preparador físico.

Luiz Felipe Scolari morava em um condomínio fechado em Riad. Seus vizinhos eram estrangeiros que também estavam trabalhando no país: norte-americanos, indianos e turcos. "De vez em quando, eu fazia um churrasco e convidava todo mundo. Tomava chimarrão e mostrava para eles como fazer uma carne", conta o técnico.

Outro que gostava de comandar churrascos na Arábia Saudita era Telê Santana. O problema era que sua peça predileta de carne, costela de boi, era sempre muito dura. Os convidados já iam para o churrasco preparados para uma emergência, no caso de quebrarem um dente ao morder o churrasco de Telê.

Nelsinho viajava com o Al-Hilal para uma partida fora da cidade. Instantes antes do embarque, um dos jogadores pediu para ser dispensado, pois tinha um compromisso muito importante e inadiável. Indagado pelo técnico brasileiro sobre o que seria o tal compromisso, respondeu: "Eu preciso ir buscar um carro na oficina".

A bagagem de retorno do técnico Luiz Felipe Scolari veio com muito excesso de peso. O motivo foram os tapetes persas comprados pelo treinador e por sua mulher, que até hoje adornam sua casa, no Rio Grande do Sul.

Candinho estava trabalhando havia pouco tempo na Arábia Saudita. Em um jogo do Al-Hilal, irritado com a bagunça no vestiário, determinou que todas as pessoas estranhas ao clube fossem expulsas do recinto. O intérprete apontou para um homem e perguntou: "Até ele?" Candinho disse que sim. O homem era o príncipe Sutã, filho mais jovem do rei Fahd.



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