São Paulo, segunda-feira, 19 de agosto de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

FUTEBOL

A chatice das enquetes

JÚLIO VERÍSSIMO
EDITOR-ADJUNTO DE BRASIL

Já não se assiste mais a uma partida de futebol pela TV como antigamente. Acabou aquele tempo em que você, no domingo ou no sábado, se refestelava na poltrona e acompanhava o jogo de seu time -ou de outra equipe qualquer- sem interferências chatas e desnecessárias, que impedem até a visualização de um lance mais emocionante na tela.
Se o jogo estivesse abaixo da crítica então, mais um motivo para assisti-lo. Ou melhor, ouvi-lo. Sim, pois bastava baixar o volume, virar para o lado e tirar aquele cochilo, que só era interrompido com o grito de gol do narrador.
Melhor sonífero, impossível. Quanto aos comentaristas, tanto faz como tanto fez. Ex-juízes e ex-jogadores renomados desfiando um rol de achismo sem fim.
Basta lembrar da última Copa. No intervalo do segundo jogo contra a Turquia, Casagrande defendeu a saída de Ronaldo do time. O resto da história todo mundo conhece.
Mas, de uns tempos pra cá, tudo mudou. Os sábios da bola já não reinam sozinhos. Infelizmente, a internet invadiu a tela da TV e passou a dividir o precioso tempo com os melhores momentos e os lances mais polêmicos.
Refiro-me à chatice das enquetes interativas. Aquelas em que o narrador lança uma pergunta no ar e, num esforço monumental, pede aos telespectadores que respondam. Tudo em nome da interação, pois, além do monopólio na transmissão da maioria dos eventos esportivos, sobretudo futebol, a principal emissora do país quer "conversar" com o torcedor.
E tome mais e mais perguntas. Todas dotadas de uma profundidade que só o futebol pode gerar. Imagine, por exemplo, uma partida entre Palmeiras e Gama. Lá pelas tantas, eis que surge a oportunidade de ouro. E o narrador lança a pergunta: Na sua opinião, qual dos grandes paulistas deve chegar à fase final do Brasileiro?
Bem, partindo do pressuposto de que boa parte da audiência é de palmeirenses e, claro, a outra parcela é de corintianos torcendo contra, bingo!, deu Palmeiras na cabeça. Nem sequer informam quantas pessoas acessaram o tal site interativo.
Só que o pior está por vir. Afinal, é preciso orientar o internauta sobre como ele pode acessar o site da emissora. Pronto. Eis que surge na tela, em cores berrantes, uma faixa que cobre boa parte do jogo, com o famoso www...e assim por diante.com.br (sem acento, não esqueça!).
E tome perguntas, as mais estapafúrdias possíveis, com o objetivo de "enriquecer" a cultura futebolística. Entretanto, como não sou saudosista, rendo-me aos tempos modernos e relaciono abaixo algumas perguntas a título de modesta contribuição:
1) Dos 22 jogadores em campo, quantos você acha que têm outra camiseta por baixo do uniforme, com frases originais, como "Deus é amor", "Cristo é o caminho", "Fulana, te amo" (serve tanto para mulher quanto para filhos), "100% Paraíba, Minas, Alagoas" e, pasme, "Jardim Irene"?
2) Você acha que técnico de futebol deve ou não ser chamado de "professor" por seus jogadores?
3) Quantas vezes Arnaldo César Coelho disse "A regra é clara" em uma partida de futebol?
4) Quantas vezes você já ouviu "O que importa são os três pontos e ajudar o time a conquistar seu objetivo"?"
5) Quantos leitores chegaram até o fim dessa chatice? Obrigado!


Hoje, excepcionalmente, José Geraldo Couto não escreve nesta coluna

A chance perdida

O Palmeiras perdeu a chance de ouro de acabar com uma das maiores dúvidas do futebol brasileiro. Afinal, Candinho seria ou não um bom treinador para o clube? Sai técnico, entra técnico, sempre se ouve a mesma coisa. Candinho é o técnico dos sonhos do presidente palmeirense. Agora, outra oportunidade foi desperdiçada. Veio o Murtosa, clone do Scolari. Mas logo vai passar a ser tratado de "Felipinho". O jeito é esperar mais uma temporada.

Compensação

A seleção de vôlei perdeu o título da Liga Mundial para a Rússia. Em compensação, o telespectador ganhou: não precisou assistir ao indefectível "Sandy & Junior". Pulou direto para o filme "Parque dos Dinossauros". Mas, para variar, no jogo São Caetano e Corinthians, houve mais duas enquetes chatas, que não enriqueceram em nada o futebol brasileiro.


Texto Anterior: Romário faz 2 e Flu vence
Próximo Texto: Futebol: Com cautela, Corinthians muda e perde
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.