São Paulo, terça-feira, 19 de dezembro de 2000

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Contratos e cifras nebulosos igualam sensação da JH aos clubes "grandes"

O lado desconhecido do desconhecido São Caetano

Vice de futebol do finalista do Nacional é empresário de jogadores do clube, que subestima salários e é apadrinhado pela prefeitura

FÁBIO VICTOR
DA REPORTAGEM LOCAL

O São Caetano de futebol alegre e ofensivo, que encantou e surpreendeu o Brasil ao passar à final da Copa João Havelange, tem por trás de si histórias nebulosas de parcerias e métodos obscuros de administração que estão mais próximos dos clubes tradicionais do país do que do frescor inocente de uma equipe de apenas 11 anos.
A falta de clareza começa na empresa tida como uma das principais responsáveis pela evolução da equipe nos últimos anos.
A Datha Representações firmou uma parceria com o São Caetano em 1997, com o objetivo de captar recursos para o clube. Na época, o time sobrevivia graças à Prefeitura de São Caetano do Sul e à receita vinda de um bingo.
Segundo o acordo, a Datha não receberia nada pela parceria, só em retorno de imagem. Os jogadores seriam sempre vinculados ao clube, nunca à empresa.
Mas não foi isso que ocorreu. O homem da Datha dentro do São Caetano, José Carlos Molina, virou empresário de atletas do time.
Pelo menos dois jogadores -o lateral-esquerdo César e o volante Claudecir- admitem que são representados por Molina. O volante Magrão, recentemente vendido ao Palmeiras, também.
Com o sucesso do São Caetano na JH, Molina sumiu. No clube e na empresa, alega-se que foi por problemas de saúde. A Datha diz que a parceria acabou. A Folha tentou em diversas ocasiões falar com o empresário -sem sucesso- em sua casa e em seu escritório. Em uma das tentativas, uma secretária da Datha, irritada, desligou o telefone na cara do repórter, após garantir que a empresa não mantém relação com o clube.
O presidente do São Caetano, Nairo Ferreira de Souza, não gosta de comentar a questão. Diz, porém, que a Datha ainda é parceira do clube, ao menos até o final de sua gestão, em janeiro, e que Molina é seu vice de futebol.
Souza diz não ver problema em Molina ser simultaneamente dirigente e empresário de jogadores do clube -embora afirme que o seu vice não é empresário, mas "procurador" de atletas.
"Procurador é outra coisa. Eu mesmo sou procurador do Magrão (atacante do Botafogo e genro de Souza)", declara.
Outro assunto evitado como um fantasma nos bastidores do São Caetano é a relação do clube com o seu ex-patrocinador Casas Bahia. Jogadores e pessoas ligadas ao cotidiano da equipe que pediram para não serem identificados revelaram que a rede de lojas mantém forte influência nas despesas e decisões do clube.
Um dos herdeiros da rede, Saul Klein, responsável pela área comercial da Casas Bahia, é torcedor entusiasmado do time e apontado como espécie de eminência parda do São Caetano. O atual patrocinador do clube, a Consul, é fornecedora das Casas Bahia -assim como a Sharp, ex-patrocinadora.
Empresas que trabalham para as Casas Bahia também servem ao São Caetano -como a corretora Marine Seguros, responsável por vultosas apólices da rede mas também por outras, bem mais modestas, de carros de jogadores.
"A Casas Bahia não tem nada a ver com o São Caetano. Nem gostaria que você tocasse nesse assunto", disse Nairo Souza.
A secretária de Saul Klein, Vânia, disse à reportagem que não adiantaria tentar falar com o empresário sobre o assunto, pois a Casas Bahia não tinha relação com o São Caetano.
A folha de pagamento mensal do São Caetano também é algo bem distante da clareza.
À reportagem da Folha o presidente do clube já afirmou que gastava R$ 120 mil com os salários dos jogadores. Em outra oportunidade, a outro repórter, baixou o valor para R$ 72 mil.
A realidade, porém, é muito menos espartana. Só o meia Aílton, que tem o maior salário entre os 26 atletas do futebol profissional, ganha cerca de R$ 35 mil.
Um pouco abaixo disso estão os atacantes Zinho e Leto e o goleiro Sílvio Luís. Os destaques do time -o atacante Adhemar, além de César e Claudecir- recebem em torno de R$ 10 mil.
De acordo com levantamento feito pela reportagem, a folha de pagamento da equipe gira em torno de R$ 230 mil, sem incluir os salários da comissão técnica.
Por fim, dando cores "chapa-branca" ao famoso "Azulão", o clube tem uma relação de pai para filho com a Prefeitura de São Caetano do Sul -no caso, a administração municipal é o pai.
Além de ter cedido um terreno público em forma de comodato para o clube construir sua sede, ceder (e estar reformando) o estádio Anacleto Campanella, a prefeitura sustenta as divisões de base do São Caetano e fornece transporte gratuito. O prefeito Luiz Tortorello (PTB) é presidente de honra do clube.

Colaborou João Carlos Assumpção, do Painel FC

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