São Paulo, sábado, 20 de janeiro de 2007

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JOSÉ GERALDO COUTO

O time do tempo


Os conterrâneos Rogério Ceni e Alexandre Pato marcam os extremos da fugaz carreira de futebolista profissional


"ENVELHEÇAM" , foi o célebre conselho que Nelson Rodrigues deu aos jovens, olhando seriamente para a câmera, num programa de televisão. Sempre achei o episódio muito engraçado, mas agora, beirando os 50, já não vejo tanta graça. Sobretudo quando, ao jogar bola, as pernas não obedecem mais ao comando do cérebro. Isso por enquanto. Daqui a pouco é o próprio cérebro que não vai saber comandar. Depois, num desligamento progressivo de circuitos (como o do computador HAL em "2001"), esquecerá o que é impedimento, escanteio, pênalti. E, por fim, ignorará por completo o sentido da palavra futebol.
Se a passagem do tempo é implacável para todo mundo, para alguns (como as modelos e os jogadores de futebol) ela é particularmente cruel. Depois dos 30, é preciso começar a construir nova vida, totalmente diferente da primeira. Pois bem. Quis o destino que os principais astros em atividade no futebol brasileiro -o goleiro Rogério Ceni e o atacante Alexandre Pato- estivessem nos extremos opostos da carreira.
O primeiro, que na segunda-feira completa 34 anos, já conquistou tudo o que podia e se encaminha para um glorioso final de carreira. O segundo, que mal estreou como profissional e já ganhou o título mundial de clubes, está no início de uma carreira que se prenuncia meteórica. Dificilmente terminará o ano atuando no Brasil. Tem a metade da idade de Rogério. A ironia maior é que ambos vêm da modesta Pato Branco (PR), de 70 mil habitantes.
O futuro do goleiro tricolor está mais ou menos traçado. Com sua inteligência, prestígio e carisma, deverá seguir carreira nos bastidores do futebol. Não é impossível que chegue a presidente do clube em que brilha há 16 anos. Já a vida que o jovem Pato tem pela frente é um livro com as páginas em branco. Tudo pode acontecer.
Ele pode se apagar como uma estrela cadente, depois de brilhar intensamente por um momento, ou pode se tornar um craque do futebol mundial, a ser lembrado durante décadas. Nada está escrito de antemão. (Escrevo este texto antes de Brasil x Argentina. Espero que Pato tenha exibido seu futebol luminoso.) Em entrevista a Rodrigo Bueno publicada ontem na Folha, Pato disse que quer um dia fazer gol em Rogério. Seria uma justiça poética, desenho bonito na linha do tempo.
Também para um craque como Romário o tempo passa impiedosamente. Aos 41 anos, ele ainda tenta chegar ao milésimo gol. Mas a idade, as contusões e a Fifa dificultam a empreitada. Sem poder jogar o Estadual do Rio, sua esperança se concentra nos amistosos que o Vasco pode marcar para ele. Para o bem do próprio jogador e da sua imagem para a posteridade, torço para que ele faça o milésimo (por mais discutível que seja o seu cômputo) no Campeonato Brasileiro, jogando partidas de verdade contra times de verdade.
Por fim, o tempo passa para essa espécie de contrafação de Romário que se chama Túlio. Ele mesmo, Túlio Maravilha, três vezes artilheiro do Campeonato Brasileiro. Lembram-se de quando Túlio, então no auge (meados dos anos 90), comprou um apartamento no mesmo prédio de Romário, alguns andares acima do rival? Pois é. O ex-botafoguense -que fará 38 anos, mas se diz "com rostinho de 18"- continua sendo uma versão meio paródica do craque do Vasco.
Pela acanhada Canedense, ele joga o Goiano com a meta de chegar aos 800 gols (está com 700). Tomara que consiga também. Todo mundo tem o direito de realizar seus sonhos, desde que não cause pesadelo a outros. E por falar em tempo: hoje faz 24 anos que morreu Garrincha, aquele de quem "o time do tempo ganhou".

jgcouto@uol.com.br


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