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São Paulo, domingo, 20 de abril de 2003

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FUTEBOL

Apenas quatro clubes da Série A ainda mantêm equipes femininas; técnico da seleção diz que esporte "não existe"

Brasil não é o país do futebol (feminino)

RICARDO WESTIN
DA SUCURSAL DO RIO

Dentro de campo, a atacante Kátia Cilene e a zagueira Marina defendem a mesma seleção brasileira feminina de futebol. Fora dele, vivem realidades diferentes.
Kátia, 26, é jogadora do San José CyberRays, um dos principais times dos EUA. Diante do convite para ganhar US$ 80 mil por ano, decidiu deixar o Brasil há dois anos. Mora com uma família americana na Califórnia e tem planos de cursar marketing esportivo. "Por enquanto, não penso em voltar", diz a jogadora.
Marina, 22, é instrutora numa academia de ginástica em Guarapuava (PR) e só pode treinar aos sábados, depois de viajar 400 km até Foz do Iguaçu, onde fica a sede de sua equipe, o Gresfi. "Recebo só uma ajuda de custo, mas é melhor eu nem dizer de quanto é."
As histórias revelam a agonia em que se encontra o futebol feminino no país. As duas equipes brasileiras que Kátia defendeu -Vasco e São Paulo- não existem mais e ela só pôde se tornar profissional atuando no exterior.
Para Marina, o sacrifício de jogar num time que não oferece salário só vale a pena pela possibilidade de ser convocada para a seleção. "O futebol feminino praticamente não existe no Brasil", resume o técnico da seleção brasileira, Paulo Gonçalves.
No país do futebol pentacampeão, de fato, é difícil encontrar equipes dispostas a investir nas mulheres. Apenas quatro dos 24 times que disputam a Série A do Brasileiro mantêm times femininos -Guarani, Internacional, Juventude e Santos. Os demais não querem saber do assunto.
Mesmo na seleção existem jogadoras sem time. É o caso da zagueira Juliana, 22, que defendeu o Brasil em Sydney-2000, mas só conseguiu apoio de uma equipe de futebol de salão de São Paulo.
Os clubes cobram da CBF e das federações estaduais um calendário oficial de competições. A quarta e última edição do Brasileiro aconteceu em 2001. Os Estaduais de São Paulo e do Rio, por exemplo, não devem acontecer neste ano. Sem torneios, não há como manter uma equipe.
Com o fim do Campeonato Gaúcho do ano passado, em que o Grêmio foi vice-campeão, todas as jogadoras tiveram que ser dispensadas. Há a esperança de que possam voltar no fim do ano, mas só se houver uma nova edição do torneio, o que não está certo.
O círculo vicioso se fecha com a defesa da CBF e das federações, que dizem que não podem organizar campeonatos se não houver equipes para disputá-los.
"Enquanto isso, os talentos continuam escondidos", diz o técnico da equipe feminina do Santos, Kleiton Lima, que foi preparador físico de Diego e Robinho. "No caso das mulheres, não podemos pensar em categorias de base. Nem mesmo as equipes principais são oficializadas."
O Internacional é a grande exceção. As jogadoras do atual campeão gaúcho recebem salário, têm carteira de trabalho assinada e podem se dedicar ao esporte em tempo integral.
O segredo do sucesso é a escolinha de futebol, que existe há oito anos e forma as atletas da equipe principal. Além do treinamento convencional, as meninas ainda têm aulas de inglês. Duda, a coordenadora técnica do time gaúcho, explica: "Se os homens pensam em jogar lá fora, mesmo com todas as boas oportunidades que eles têm no Brasil, imagine as mulheres, que não têm opção nenhuma por aqui. Todas pensam em ir para os Estados Unidos."


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